Contra-ordenação. Decisão administrativa. Elemento subjectivo. Alteração substancial dos factos. “reformatio in pejus”. Sucessão de leis no tempo. Regime concretamente mais favorável. Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada

CONTRA-ORDENAÇÃO. DECISÃO ADMINISTRATIVA. ELEMENTO SUBJECTIVO. ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS. “REFORMATIO IN PEJUS”. SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO. REGIME CONCRETAMENTE MAIS FAVORÁVEL. INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA

RECURSO CRIMINAL Nº 820/23.8T9LRA.C1
Relator: FÁTIMA SANCHES
Data do Acórdão: 13-12-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE LEIRIA – JUIZ 3
Legislação: ARTIGOS 3.º, 58.º E 72.º-A DO D.L. N.º 433/82, DE 27 DE OUTUBRO/ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL/RGCO; ARTIGO 410.º, N.º 2, ALÍNEA A), DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

 Sumário:

I – No âmbito do recurso contraordenacional o tribunal da relação funciona como tribunal de revista e apenas conhece da matéria de direito, excepção feita aos casos em que, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto claramente insuficiente, fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias, oficiosamente decida conhecer dos vícios referidos no artigo 410.º, n.º 2, do C.P.P.
II – Os requisitos exigidos pelo artigo 58.º do RGCO visam garantir que o destinatário da decisão administrativa exerça, de forma cabal, os seus direitos de defesa e tal mostra-se assegurado se a decisão, ao nível da fundamentação de facto, contiver “a descrição dos factos imputados”, permitindo-lhe compreender, de acordo com os critérios da normalidade de entendimento, as razões pelas quais o agente é condenado, de modo a que este possa adequadamente impugnar os fundamentos dessa condenação.
III – Não obstante a matéria de facto constante da decisão administrativa não conter qualquer referência ao elemento subjectivo da infracção, se tais referências constarem da parte atinente ao direito tal não constitui qualquer vício já que aquela decisão, não sendo uma sentença, não tem que obedecer ao formalismo a que esta deve obedecer.
IV – O juiz que julga em 1.ª instância a impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, embora não podendo proceder à alteração substancial dos factos constantes da decisão administrativa, não está absolutamente vinculado aos factos que constam do seu texto.
V – A circunstância de o juiz, no elenco dos factos julgados provados, descrever os factos integradores do elemento subjetivo que constavam da decisão administrativa, constitui mera correcção de carácter técnico e não alteração substancial dos factos.
VI – À semelhança do que ocorre no processo penal, em matéria contraordenacional aquando da decisão o tribunal deve atentar na circunstância de ter ocorrido alteração da lei que prevê e pune os factos entre a sua prática e a decisão e, quando tal aconteça, deve aplicar ao caso os regimes legais que se sucederam para, comparando os respectivos resultados, optar, obrigatoriamente, por aquele se se mostre, em concreto, mais favorável para o arguido.
VII – Faltando elementos para se concluir pelo regime mais favorável, resulta que a decisão judicial em recurso padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, do artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do C.P.P.

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