Segredo profissional de advogado. Pedido de escusa

SEGREDO PROFISSIONAL DE ADVOGADO. PEDIDO DE ESCUSA
RECURSO PENAL Nº
132/08.7JAGRD-C.C1
Relator: DR. BRÍZIDA MARTINS
Data do Acordão: 16-12-2009
Tribunal: GUARDA 
Legislação: ARTIGOS 87º DO EOA, 135ºDO CPP
Sumário:

  1. A audição do organismo representativo da profissão deve ter lugar antes da decisão sobre a legitimidade do pedido de escusa, como resulta claramente da remissão do n.º 4 para o n.º 2 do artigo 135.ºdo CPP.
  2. Nada obsta, contudo, a que também o tribunal superior oiça, sendo necessário, o organismo representativo da profissão, como resulta igualmente da remissão do n.º 4 para o n.º 3 do artigo 135.ºdo CPP.
  3. O incidente de quebra de sigilo profissional está dividido em duas fases: a questão da legitimidade da escusa é tratada no n.º 2 do artigo 135.ºdo CPP; a questão da justificação da escusa é tratada no n.º 3 do artigo 135.ºdo CPP.
  4. A resolução destas questões foi intencionalmente separada pelo legislador, conferindo competência para decidir a questão da legitimidade da escusa ao tribunal de primeira instância e competência para decidir a questão da justificação da escusa apenas ao tribunal superior.
  5. A decisão sobre a quebra do sigilo profissional é uma decisão de ponderação de diversos valores constitucionais em conflito e, portanto, tem natureza constitucional, por isso deve estar reservada aos tribunais.
  6. A vinculação dos tribunais a uma decisão prévia dos organismos representativos da profissão em matéria de natureza constitucional não se compadece com a independência dos tribunais, nem com o princípio da prossecução da verdade material e encurta de forma inadmissível as garantias da defesa.
  7. O julgador deve desaplicar aquelas normas com a interpretação referida, devendo aplicá-las no sentido de considerar a “audição” da decisão do organismo representativo da profissão como não vinculativa.
  8. A quebra do sigilo profissional impõe uma criteriosa ponderação dos valores em conflito, em ordem a determinar se a salvaguarda do sigilo profissional deve ou não ceder perante outros interesses, designadamente o da colaboração com a realização da justiça penal.
  9. Tal ponderação deve partir do circunstancialismo em causa, designadamente dos factos concretos cuja revelação se pretende, de modo a garantir que, no quadro de uma crise de valores conflituantes, prevaleçam aqueles a que Constituição e a Lei reconheçam prioridade.
  10. Esta em causa a apreciação de um caso de violência doméstica e de homicídio qualificado, sendo que a malograda vítima contactara o Ex.mo Advogado recusante no sentido em que a patrocinasse no processo litigioso de dissolução do casamento que mantinha com o ora arguido.
  11. Feito o balanço entre os interesses prosseguidos com o estabelecimento do apontado dever de sigilo – de tutela da confiança do cliente no mandato outorgado ao seu advogado e da própria dimensão social que a profissão tem imanente –, e os interesses que com ele conflituam nos autos, os primeiros devem ceder aos últimos.
  12. No caso justifica-se que cesse o dever de sigilo profissional do Sr. Advogado, e, antes, se abra caminho a uma colaboração na descoberta da verdade material, única forma de se fazer a justiça que o caso impõe.

Consultar texto integral