Prova por declarações de parte. Valor probatório. Cláusulas contratuais gerais. Ónus de alegação e prova. Contrato de aluguer de cofres. Banco. Obrigação de guardar o cofre. Incumprimento. Culpa grave
PROVA POR DECLARAÇÕES DE PARTE. VALOR PROBATÓRIO. CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS. ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA. CONTRATO DE ALUGUER DE COFRES. BANCO. OBRIGAÇÃO DE GUARDAR O COFRE. INCUMPRIMENTO. CULPA GRAVE
APELAÇÃO Nº 4681/21.3T8CBR.C1
Relator: CATARINA GONÇALVES
Data do Acórdão: 11-03-2025
Tribunal: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Legislação: ARTIGOS 466.º, N.º 3, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, 5.º E 6.º DO DLEI N.º 446/85, DE 25/10, 4.º, N.º 1, ALÍNEA O), DO RGICSF (DLEI N.º 298/92, DE 31-12) E 487.º, N.º 2, DO CÓDIGO CIVIL.
Sumário:
I – Na parte em que não envolva confissão, a prova por declarações de parte está sujeita à livre apreciação do tribunal e o seu valor probatório não está submetido, do ponto de vista formal e legal, a qualquer restrição em relação aos restantes meios de prova submetidos à livre apreciação do julgador; o seu valor probatório será, portanto, aquele que, casuisticamente, lhe deva ser atribuído pela análise prudente do juiz nas concretas circunstâncias do caso;
II – Nada obsta, portanto, a que o julgador funde a sua convicção e decisão exclusivamente nas declarações de parte – mesmo que não corroboradas por outra prova –, desde que, na análise crítica que lhe cabe efectuar, com ponderação de todas as circunstâncias relevantes (o interesse directo do depoente nos factos que vem relatar, a existência de outros elementos que – de modo directo ou indirecto –, o corroborem, a forma como o depoimento foi prestado e outras circunstâncias relevantes), o juiz se convença da sua veracidade e da sua suficiência e idoneidade para fundar a convicção segura com base na qual tem que fazer o julgamento referente à matéria de facto.
III – Para que uma determinada cláusula se considere excluída do contrato, por aplicação do regime previsto no Dec. Lei n.º 446/85, de 25/10 e por não ter sido feita a prova de que ela havia sido comunicada a quem a subscreveu ou a ela aderiu, é necessário que o subscritor/aderente tenha alegado previamente que subscreveu/aderiu a essa cláusula sem que ela tivesse sido objecto de negociação e sem que ela lhe tivesse sido comunicada, nos termos legais, pelo proponente; só após o cumprimento deste ónus de alegação (a cargo do subscritor/aderente) pode ser imposto à outra parte o ónus de prova acima referido.
IV – No contrato de aluguer de cofres (a que se reporta o art.º 4.º, n.º 1, alínea o), do RGICSF), a instituição bancária não se limita a disponibilizar o uso do cofre, assumindo também a obrigação (essencial) de guardar o cofre (e, consequentemente, os bens que nele tenham sido depositados), garantindo a sua inviolabilidade com as condições de segurança que são próprias e expectáveis de um banco cuja actividade se rege, por norma e por princípio, por elevados padrões de segurança.
V – O Banco que, na sequência da recepção de um alerta gerado no sistema de segurança privada referente à perda de comunicações com uma das suas agências, se limita a contactar as autoridades policiais para o efeito de verificar (pelo exterior) se algo de anormal se passava e que, após essa verificação exterior, se conforma com o facto de a agência ficar sem qualquer comunicação e vigilância durante a noite e por várias horas sem nada mais fazer, incumpre, com culpa grave, a obrigação que havia assumido em relação aos particulares com quem havia celebrado contratos de aluguer de cofre, respondendo, por isso, pelo valor dos bens que estes ali tinham depositados e que dali foram retirados por força de furto ocorrido naquela agência durante o período em que, após o alerta acima mencionado, ela ficou sem qualquer comunicação e vigilância.
(Sumário elaborado pela Relatora)