Declarações para memória futura. Inquirição em audiência da testemunha/vítima que prestou declarações para memória futura. Recusa a depor. “venire contra factum proprium”

DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA. INQUIRIÇÃO EM AUDIÊNCIA DA TESTEMUNHA/VÍTIMA QUE PRESTOU DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA. RECUSA A DEPOR. “VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM”

RECURSO CRIMINAL Nº 340/22.8PBCLD.C1
Relator: PEDRO LIMA
Data do Acórdão: 07-06-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DAS CALDAS DA RAINHA
Legislação: ARTIGOS 67.º-A, Nº 1, ALÍNEA B), E 3, 118.º, N.º 1 E 2, 120.º, N.º 1 E 3, ALÍNEA A), 123.º, N.º 1, 134.º, N.º 1, ALÍNEA B), E 271.º, N.º 8, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL/C.P.P.; ARTIGOS 17.º, N.º 2, 20.º, N.º 1, 21.º, N.º 2, ALÍNEA D), E 24.º, N.º 6, DA LEI N.º 130/2015, DE 4 DE SETEMBRO/ESTATUTO DA VÍTIMA; ARTIGOS 2.º, ALÍNEAS A) E B), 14.º, N.º 1, E 33.º, N.º 7, DA LEI N.º 112/2009, DE 16 DE SETEMBRO/REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, À PROTECÇÃO E À ASSISTÊNCIA DAS SUAS VÍTIMAS

Sumário:

I – As declarações para memória futura visam evitar uma segunda confrontação da vítima com os factos e os efeitos de revitimização que potencia, tanto quanto preservar a prova contra a eventualidade de ulterior perda ou adulteração.
II – A nova prestação de declarações em audiência das vítimas de violência doméstica e vítimas especialmente vulneráveis é excepcional, como resulta dos artigos 33.º, n.º 7, da Lei 112/2009 e 17º, n.º 2, e 24º, n.º 6, do Estatuto da Vítima, devendo ocorrer apenas se “for indispensável à descoberta da verdade e não puser em causa a saúde física ou psíquica da pessoa que o deva prestar”.
III – Daqui não resulta uma inviabilidade de princípio da prestação de novas declarações, tanto nos casos expressamente previstos, de indispensabilidade para a descoberta da verdade, como naqueles em que a própria testemunha/vítima as quer prestar, caso em que não pode ser privada de tal direito.
IV – Mesmo entendendo-se que a nova prestação de declarações em audiência das vítimas de violência doméstica e vítimas especialmente vulneráveis fora dos casos previstos na lei é ilegal, a situação configurará irregularidade ou nulidade, a arguir nos termos dos art. 123.º, n.º 1, ou 120.º, n.º 1 e 3, al. a), do C.P.P.
V – O facto de as declarações para memória futura prestadas nos autos não terem sido indicadas na acusação entre as provas a produzir não impede o tribunal de as valorar, ao abrigo do artigo 340.º, n.º 1 e 2, do C.P.P., se as tiver como necessárias para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.
VI – Pode reputar-se de falta de interesse em agir, e um venire contra factum proprium, a circunstância de o Ministério Público se insurgir contra a convocatória de uma testemunha para ser ouvida em julgamento, quando esta foi por si arrolada na acusação com esse objectivo

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