Contrato promessa. Mandato sem representação. Ineficácia relativa. Abuso do direito

CONTRATO PROMESSA. MANDATO SEM REPRESENTAÇÃO. INEFICÁCIA RELATIVA. ABUSO DO DIREITO

APELAÇÃO Nº 24/23.0T8MGL.C1
Relator: SÍLVIA PIRES
Data do Acórdão: 18-06-2024
Tribunal: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE MANGUALDE
Legislação: ARTIGOS 217.º; 262.º, 2; 268.º; 289.º; 410.º, 1 E 2; 473.º, 1; 804.º A 806.º, 1157.º; 1178.º E 1180.º, DO CÓDIGO CIVIL

 Sumário:

I – O mandato com representação pode apresentar-se com uma estrutura integrada, em que, simultaneamente, com a constituição do mandato se emite uma procuração, conferindo ao mandatário poderes de representação para a execução do mandato ou o mandato e a procuração se apresentam como atos distintos, sendo que, em ambos os casos estamos perante um contrato misto de tipo múltiplo.
II – A circunstância de alguém ter intervindo no contrato-promessa de compra e venda, subscrevendo-o na qualidade declarada de representante do Autor, não transforma um mandato que se constituiu sem a atribuição de poderes representativos para tal vinculação contratual, num mandato com representação. Tal circunstância apenas revela que essa pessoa agiu em nome do Autor sem estar investido de poderes para o fazer, pelo que estamos perante um caso de representação sem poderes, previsto no art.º 268º do C. Civil.
III – Se determinados atos não refletirem concludentemente uma vontade de ratificar um contrato-promessa de compra e venda celebrado por um representante sem poderes para outorgar esse negócio e de não obedecerem à forma escrita exigida para uma ratificação desse tipo de negócio, os mesmos nunca podem ser encarados como uma ratificação implícita, uma vez que não se provou que tenham ocorrido posteriormente a ter sido dado conhecimento ao Autor dos termos do contrato necessitado de ratificação.
IV – O venire é uma manifestação do princípio da confiança, exigindo-se, que excecionalmente se tenha verificado uma situação de confiança na ratificação do negócio celebrado sem poderes de representação, traduzida na boa fé subjetiva da contraparte causada pela atuação do principal, que lhe tenha feito crer, com uma margem elevada de segurança, que iria ratificar aquele negócio.
V – Inexistindo elementos fácticos suficientes que nos permitam concluir que a não ratificação pelo Autor do contrato-promessa celebrado em seu nome pelo Réu constitua um venire contra factum proprio, permitindo o recurso ao instituto do abuso de direito para que se dispense a ratificação daquele negócio pelo Autor de modo a que o mesmo o vincule, aquele contrato-promessa é ineficaz relativamente ao Autor.

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