Contra-ordenação. Princípio do contraditório. Direito de defesa. Dados pessoais
CONTRA-ORDENAÇÃO;FASE ADMINISTRATIVA; PRINCIPIO DO CONTRADITÓRIO;DIREITO DE DEFESA; PRODUÇÃO DE PROVA;PRINCIPIO DA INVESTIGAÇÃO; CAPTAÇÃO DE IMAGEM POR RADAR;MEIO DE PROVA PROIBIDO; TRATAMENTO DE DADOS PESSOAIS;DIREITO À PRIVACIDADE; NULIDADE DE ACTO PROCESSUAL
RECURSO PENAL N.º 401/07.3TBSRE.C2
Relator: DR. BELMIRO ANDRADE
Data do Acordão: 11-06-2008
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE SOURE
Legislação Nacional: ARTIGOS 50.º E 54.º DO REGIME GERAL DAS CONTRA-ORDENAÇÕES; ARTIGOS 10.º E 12.º DA LEI N.º 1/2005, DE 10 DE JANEIRO; 118.º; 123.º, N.º 2 E 126.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
Sumário:
- A fase administrativa de um processo contra-ordenacional é uma fase inquisitória, equivalente à fase de inquérito em processo penal, pelo que a entidade administrativa tem o poder de aferir da necessidade e conveniência da produção de provas que hajam sido requeridas pelo arguido;
- A autoridade administrativa tem o poder de ordenar a realização de entre as diligências requeridas aquelas que se revelem pertinentes e relevantes para o apuramento da verificação ou não do facto quialificado como contra-ordenacional.
- A utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum foi regulada pela Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, que foi objecto de alterações pontuais pela Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho.
- Os registos, a gravação e o tratamento de dados pessoais têm lugar, apenas, para as finalidades, específicas determinadas na lei (cfr. art. 10º): – Detecção de infracções rodoviárias e aplicação das correspondentes normas estradais; – Controlo de tráfego, prevenção e socorro em caso de acidente; – Localização de viaturas furtadas ou procuradas pelas autoridades judiciais ou policiais para efeitos de cumprimento de normas legais, designadamente de carácter penal, bem como a detecção de matrículas falsas em circulação; -Prova em processo penal ou contra-ordenacional nas diferentes fases processuais.
- A lei não exige o inventário e notificação dos equipamentos à CNPD (Comissão Nacional de Protecção de Dados).
- A CNPD não detém competência exclusiva da fiscalização da violação dos mencionados direitos, liberdades e garantias, essa função também cumpre, por expressa determinação legal e por maioria de razão, aos tribunais a quem compete, em última instância, fiscalizar as decisões da própria C.N.P.D. Como entidade administrativa independente que funciona junto da Assembleia da República, tem como atribuição genérica controlar e fiscalizar o processamento de dados pessoais, em rigoroso respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituição e na lei.
- Na utilização de um aparelho de radar para medição da velocidade instântanea a que circulam os veículos na via pública o que está em causa é apenas o modo de utilização de um equipamento de radar, em local público, o que obriga todos aqueles que utilizam esse espaço público a assumir o risco inerentes ao “convívio” os demais que tenham necessidade ou queiram utilizar a mesma estrada, ficando, deste modo, o espaço de liberdade de cada um reduzido pela “comunhão” forçada na utilização do espaço aberto ao universo de todos os cidadãos.
- Em matéria de provas – como em todo o ordenamento jurídico em geral – vigora o princípio da ponderação dos interesses conflituantes, dando prevalência àquele que em concreto surge como preponderante, no caso, em espaço público, o interesse público na segurança da circulação rodoviária.
- Aeventual falta de comunicação (e a lei não estabelece prazo peremptório para o efeito) que, tendo o radar em causa sido homologado e aprovado após certificação pelo IPQ, não autoriza a concluir que com esse meio de prova haja sido utilizado um método proibido de prova, nos termos previstos no art.º 126.º do Código de Processo Penal.
- É que, por um lado a lei não a comina com a proibição e, por outro, os interesses materialmente pressupostos pela proibição dos meios de prova (protecção da intimidade/reserva dos dados pessoais) não se inscreverem no âmbito da protecção da norma violada (mero inventário/notificação).
- A exacta correspondência do acto processual aos parâmetros normativos que a lei estabelece para a sua perfeição permite a produção dos efeitos que lhe são próprios, mas a falta ou insuficiência dos requisitos, tornando o acto imperfeito, é susceptível de consequências jurídicas diversas em razão da gravidade do vício – cfr. Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, 1994, III, 55).
- Só a nulidade absoluta é insusceptível de sanação considerando-se sanadas as nulidades relativas quando não arguidas pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos momentos processuais expressamente prevlstos na tel artigos 120º, n.º 3, 121º, n.º1 e 105º, n.º1 do CPP.
- As nulidades relativas ou irregularidades só determinam a nulidade daquilo que puderem afectar, materialmente, dentro de uma fundamentação que leve a concluir pela sua relevância, em concreto, dentro do objecto do processo e da finalidade que o acto preterido visa alcançar.