Reserva de propriedade. Venda a prestações. Resolução. Abuso de direito
RESERVA DE PROPRIEDADE. VENDA A PRESTAÇÕES. RESOLUÇÃO. ABUSO DE DIREITO
APELAÇÃO Nº 1428/10.3TBPMS-A.C1
Relator: LUÍS CRAVO
Data do Acordão: 25-06-2013
Tribunal: PORTO DE MÓS
Legislação: ARTS. 217, 334, 409, 627, 628, 801, 808, 934 CC
Sumário:
- O art. 409º, nº1, do C.Civil, estabelece a possibilidade do alienante reservar para si a propriedade da coisa, até que o devedor cumpra, total ou parcialmente, as suas obrigações, configurando uma excepção ao princípio geral, segundo o qual, a propriedade da coisa vendida se transfere por mero efeito do contrato (art. 879º, al. a), do mesmo C.Civil).
- Por força da cláusula de reserva de propriedade, a propriedade da coisa alienada só se transfere no momento em que o comprador cumpra todas as suas obrigações, operando essa cláusula como garantia do adquirente cumprir essas obrigações (normalmente o pagamento do preço).
- Na venda a prestações, com reserva de propriedade e entrega da coisa ao comprador, o direito de resolver o contrato, radicado na norma imperativa contida no art. 934º do C.Civil, não surge automaticamente por virtude da falta de pagamento de uma prestação que exceda a oitava parte do preço.
- Adquirido pelo vendedor o direito à resolução do predito contrato, não está aquele dispensado de seguir as normas gerais, ao art. 808º nº1 do C.Civil, nomeadamente, devendo recorrer a "intimação admonitória para cumprimento", caso não consiga demonstrar a perda de interesse na prestação (a qual, nos termos do art. 808º nº2 do C.Civil, deve ser apreciada objectivamente).
- E só se pode falar em actuação com Abuso do Direito caso o vendedor aqui Exequente tivesse de alguma forma incutido no Executado ora Opoente, com a sua actuação, verificado que estava um incumprimento determinante da perda do benefício do prazo, que não iria exercitar o seu legítimo direito à exigência antecipada do saldo devedor total, nomeadamente em termos de se poder então afirmar que esse seu exercício constituía uma retaliação, pois que só aí haveria violação da regra da boa-fé e do princípio da confiança a evidenciar claro “venire contra factum proprium”, o que seguramente não ocorre quando o Exequente actuou “ab initio” em vista do pagamento do preço em dívida.