Antecedentes criminais. Vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Busca não domiciliária. Impugnação ampla da decisão da matéria de facto. Princípio in dubio pro reo. Crime de tráfico de estupefacientes. Perdimento de bem a favor do estado

ANTECEDENTES CRIMINAIS. VÍCIO DA INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA. BUSCA NÃO DOMICILIÁRIA. IMPUGNAÇÃO AMPLA DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. CRIME DE TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES. PERDIMENTO DE BEM A FAVOR DO ESTADO

RECURSO CRIMINAL Nº 354/21.5PAMGR.C1
Relator: MARIA JOSÉ GUERRA
Data do Acórdão: 11-10-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE LEIRIA – JUIZ 4
Legislação: ARTIGO 109.º, N.º 1, DO CÓDIGO PENAL; ARTIGOS 53.º, N.º 2, ALÍNEA B), 174.º, N.ºS 2, 5 E 7, 249.º, 251.º, N.º 1, ALÍNEA A) 263.º, N.º 1, 267.º, 374.º, N.º 2, 410.º, N.º 2, ALÍNEA A), 412.º, N.º 3, E 430.º DO CÓDIGO PROCESSO PENAL/C.P.P.; ARTIGOS 21.º, 25.º E 35.º, N.ºS 1 E 2, DO D.L. Nº 15/93, DE 22 DE JANEIRO

 Sumário:

I – Na enumeração dos factos provados e não provados, que o artigo 374.º, n.º 2, do C.P.P. impõe, deve constar a indicação dos antecedentes criminais, com referência expressa às condenações relevantes para a decisão a tomar, identificando os elementos distintivos do crime, a data de cometimento, as datas da condenação e do trânsito em julgado da decisão condenatória, a pena aplicada e a data de extinção da mesma.
II – Quando tais elementos faltem verifica-se o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, do artigo 410.º, n.º 3, alínea a), do C.P.P., no que à medida da pena diz respeito.
III – De acordo com o disposto no artigo 174.º, n.º 2, do C.P.P., a busca tem lugar quando houver indícios de que objectos relacionados com um crime, ou o arguido ou outra pessoa que deva ser detida, se encontram em lugar reservado ou não livremente acessível ao público.
IV – A busca prevista na alínea a) do artigo 251.º do C.P.P. é um acto de natureza cautelar, que não carece de autorização ou determinação da autoridade competente quando haja fundada razão para crer que em determinado lugar reservado ou não livremente acessível ao público e onde se encontrem suspeitos, se ocultem objectos relacionados com o crime ou susceptíveis de servirem de prova e que de outra forma poderia perder-se.
V – Nestes casos o n.º 2 do artigo 251.º do C.P.P. exige que a busca seja imediatamente comunicada ao juiz e não obstante o artigo 174.º, n.º 7, indicar como destinatário da comunicação o JIC, deve interpretar-se a norma em conformidade com as que regulam a competência para ordenar as buscas e revistas, admitindo-se que na fase de inquérito a fiscalização do procedimento levado a cabo pelo OPC quanto a buscas não domiciliárias seja realizado pelo Ministério Público.
VI – Na impugnação ampla da decisão da matéria de facto a especificação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida em caso de declarações gravadas faz-se por referência ao consignado na acta, com indicação das concretas passagens em que se funda a impugnação, e na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações com a transcrição dessas declarações, tendo o recorrente, também, que indicar os elementos de prova que não foram tomados em conta pelo tribunal quando o deveriam ter sido, os que foram considerados quando não o podiam ser, assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou a insuficiência dos elementos probatórios em que se estribaram tais conclusões e que referir o que é que nos meios de prova por si especificados não sustenta o facto dado por provado ou não provado, de forma a relacionar o seu conteúdo específico, que impõe a alteração da decisão, com o facto individualizado que se considera incorretamente julgado justificando, em relação a cada facto alternativo que propõe, porque deveria o tribunal ter decidido de forma diferente.
VII – A impressão produzida no julgador pela prova oral, e que se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e análise psicológica que traçam o perfil de cada testemunha ou declarante, só alcança a sua plenitude através da imediação, daqui resultando que o tribunal da relação só pode censurar a 1.ª instância no que a tal prova respeita quando for feita a demonstração de que aquela opção viola as regras da experiência comum. De outra forma, seriam violados os princípios da imediação e da oralidade.
VIII – Na fase do recurso a demonstração da violação do princípio in dubio pro reo passa pela respectiva notoriedade, aferida pelo texto da decisão, em termos idênticos aos que vigoram para os vícios da sentença, ou seja, tem que resultar da fundamentação desta, de forma clara, que o juiz, embora tenha permanecido na dúvida sobre a verificação de determinado facto desfavorável ao agente, o considerou provado ou que, sendo favorável ao agente, o considerou não provado.
IX – A considerável diminuição da culpa essencial à figura do crime de tráfico de estupefacientes privilegiado deve resultar de uma avaliação global da situação de facto, pela ponderação, entre outros factores, dos meios utilizados, da modalidade e circunstâncias da acção e da qualidade e/ou quantidade das substâncias, plantas ou preparados.
X – O perdimento de bens a favor do Estado exige que do factualismo provado resulte a existência de uma causalidade adequada entre a utilização desses bens e a prática do crime em causa nos autos.

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