Acidente de viação. Responsabilidade civil por facto ilícito. Ressarcimento de danos. Equidade

ACIDENTE DE VIAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL POR FACTO ILÍCITO. RESSARCIMENTO DE DANOS. EQUIDADE
RECURSO CRIMINAL Nº
18/13.3GAFIG.C1
Relator: ABÍLIO RAMALHO
Data do Acordão: 16-12-2015
Tribunal: COIMBRA
Legislação: ARTS. 4.º, AL. A), 8.º, N.º 3, 496.º, N.ºS 1 E 4, E 1878.º, DO CÓDIGO CIVIL; ART. 13.º, N.º 1, DA CRP
Sumário:

  1. A equidade, enquanto fonte legal de realização da justiça moral a lesado em bens de natureza não patrimonial – cfr. arts. 4.º, al. a), e 496.º, ns. 1 e 4, 1.ª parte, do C. Civil –, a partir, portanto, de voláteis e subjectivas ponderações de metafísicos valores de bom senso, razoabilidade, justiça natural, justa medida das coisas, igualdade, oportunidade e conveniência…, haverá natural/necessariamente de ser incorporada de afectos e pessoal sensibilidade do julgador, para além, ou com independência, pois, dos limites do sistema jurídico-positivo.
  2. Por conseguinte, a decisão judicial definitória do correspectivo valor indemnizatório, que nela se suporte, porque inevitavelmente afectada por subjectiva discricionariedade, apenas poderá merecer juízo de censura por tribunal superior – em sede de recurso –, e consequente alterabilidade, se se empiricamente evidenciar que significativamente destoe da contemporânea linha jurisprudencial respeitante a similares condições contextuais, e, assim, potencialmente comprometa a ideal segurança da aplicação do direito e o princípio constitucional da igualdade relativa, (cfr. arts. 8.º, n.º 3, do C. Civil, e 13.º, n.º 1, da Constituição).
  3. Ainda assim, a respeitante resolução recursória, porque também intrinsecamente associada a abstractos critérios de equidade, sempre, no fundo, se haverá outrossim de nortear por idêntica matriz extra-sistémica, inevitavelmente matizada pela cultura e humanidade pessoal dos respectivos Juízes.
  4. O valor indemnizatório a atribuir a vítima de atropelamento com apenas 10 (dez) anos, haverá de reunir ideal aptidão a proporcionar-lhe significativo conforto material/económico aquando da respectiva aquisição da plena capacidade civil, aos 18 (dezoito) anos, e, destarte, facultar-lhe considerável compensação moral/emocional pelas lesões, dores, angústias, frustrações e incómodos para si de tal sinistro decorrentes, no caso sub judice essencialmente condicionantes de fractura da diáfise do fémur esquerdo, internamento, imobilização e repouso absoluto por 97 dias; défice funcional temporário parcial por 557 dias, e perda de ano lectivo escolar, cujo montante se terá por minimamente razoável fixar em € 15.000,00 (quinze mil euros), correspondente ao recursivamente peticionado, por contraponto ao de € 6.500,00 (seis mil e quinhentos euros), atribuído em 1.ª instância.
  5. O ajuizamento – e respectiva vinculatividade – emergente do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) n.º 6/2014, do Plenário das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça de 09/01/2014, (publicado no DR n.º 98, 1.ª série, de 22/05/2014), não obstante especificamente reportado a cônjuge de vítima de evento lesivo de respectivos bens e/ou interesses imateriais (não patrimoniais), por analogia, (cfr. art.º 10.º, ns. 1 e 2, do C. Civil), e sob pena de violação do princípio da igualdade, prevenido sob o art.º 13.º da Constituição Nacional, deverá também aproveitar às demais individualidades jurídicas elencadas sob o n.º 2 do citado art.º 496.º do Código Civil, que, por reflexo/indirecto efeito do contextual acto ilícito, e em virtude da especial ligação que (à época) mantenham com o sinistrado, pessoalmente sofram acentuados danos morais que doutra forma provavelmente os não acometeriam.
  6. Assim, a mãe da criança atropelada que, para além das pessoais dores sentimentais e angústias naturalmente associadas à percepção do sofrimento do vitimado filho, houve que lhe excepcional e exclusivamente dedicara pessoal assistência durante todo o período da respectiva convalescença e recuperação, mesmo em detrimento dos outros filhos, com significativo esmero, esforço e incómodo, consideravelmente marginais aos comummente associados aos deveres legais da relação paternal-filial, postulados pelo art.º 1878.º, n. 1, do Código Civil, o que, não fora a produção do referido acto lesivo (atropelamento), seguramente/provavelmente não ocorreria, deverá também merecer equitativa e material compensação – absolutamente denegada em 1.ª instância –, que, no caso sub judice, se tem por ajustado fixar pelo valor razoavelmente propugnado em sede recursiva, de € 5.000,00 (cinco mil euros).

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