Princípio do acusatório. Acusação manifestamente infundada. Crime de desobediência
PRINCÍPIO DO ACUSATÓRIO. ACUSAÇÃO MANIFESTAMENTE INFUNDADA. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
RECURSO CRIMINAL Nº 1027/21.4T9ACB.C1
Relator: CRISTINA BRANCO
Data do Acórdão: 21-06-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL
Legislação: ARTIGOS 283.º, N.º 1 E 3, ALÍNEA B), E 311.º, N.º 2, ALÍNEA A), E 3, ALÍNEAS B) E D), DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; ARTIGO 348.º CÓDIGO PENAL
Sumário:
I – O n.º 3 do artigo 311.º do Código de Processo Penal foi aditado para reforçar a clareza do modelo acusatório e explicitar as funções dos vários sujeitos processuais, dele decorrendo, além do mais, que aquando da prolação do despacho de saneamento do processo o juiz está impedido de, num papel equivalente ao do Ministério Público, fazer um juízo sobre a suficiência ou insuficiência dos indícios que sustentam a acusação.
II – Uma consequência da estrutura acusatória do processo é a independência do Ministério Público em relação ao juiz na formulação da acusação, resultando dela a inadmissibilidade do juiz ordenar ao Ministério Público os termos em que deve formular acusação e de suprir os vícios de que a acusação padeça.
III – Face ao n.º 3 do artigo 311.º os vícios estruturais da acusação passaram a sobrepor-se às nulidades previstas no artigo 283.º do Código de Processo Penal e converteram-se em matéria sujeita ao conhecimento oficioso do tribunal.
IV – Da estrutura acusatória do processo penal deriva a exigência de que a acusação defina o objecto do processo, descrevendo todos os factos concretos susceptíveis de integrar os elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime imputado ao arguido, de uma forma clara e suficientemente rigorosa que permita a organização da defesa.
V – Quando a acusação imputa ao arguido a prática de um crime de desobediência mas não descreve os factos essenciais e necessários para aferir da legalidade substancial e formal da ordem transmitida ao arguido, imprescindível à configuração do tipo, resulta que a acusação é nula, vício que deve ser conhecido oficiosamente aquando do saneamento do processo, acarretando a sua rejeição, por ser de considerar manifestamente infundada