Insolvência culposa. Pressupostos

INSOLVÊNCIA CULPOSA. PRESSUPOSTOS
APELAÇÃO Nº
1146/12.8TBCVL-B.C1
Relator: CATARINA GONÇALVES
Data do Acordão: 16-09-2014
Tribunal: COVILHÃ 1º JUÍZO
Legislação: ART.186º DO CIRE
Sumário:

  1. A mera alegação – com carácter vago e conclusivo – de que os administradores da devedora (em cujo objecto se incluía a construção e venda de imóveis) venderam imóveis por valores abaixo de mercado – sem que estejam devidamente identificados esses negócios, bem como o preço acordado e o real valor de mercado dos imóveis transaccionados – não é suficiente para concluir que esses negócios (celebrados num contexto de crise económica instalada no sector) foram ruinosos e que, como tal, poderão integrar o âmbito de previsão do art. 186º, nº 2, alínea b), parte final, do CIRE;
  2. A constituição de uma hipoteca para garantia de um débito da devedora (débito cuja existência se demonstrou), para evitar que o credor o exigisse judicialmente, não corresponde a um uso do bem que seja contrário ao interesse da devedora e que, como tal, possa ser integrado no âmbito de previsão do art. 186º, nº 2, alínea f), parte final, do CIRE; a constituição dessa hipoteca poderá corresponder a um tratamento preferencial do respectivo credor relativamente aos demais e, nessa medida, poderá ser resolúvel em benefício da massa, caso se verifiquem os pressupostos legais, mas não configura um uso do bem contrário aos interesses da devedora para efeitos de qualificação da insolvência ao abrigo da norma acima mencionada;
  3. A mera circunstância de os gerentes da devedora estarem (ou deverem estar) cientes da situação de insolvência (ou pré-insolvência) em que esta se encontrava e de, ainda assim, terem prosseguido a actividade deficitária não é bastante para que se considere verificada a situação prevista no art. 186º, nº 2, alínea g), do CIRE, sendo ainda necessário que tal exploração deficitária seja prosseguida no interesse pessoal dos administradores da devedora ou no interesse de terceiro;
  4. Ao contrário do que acontece nas situações previstas no nº 2 do citado art. 186º (cuja verificação determina, por si só, a qualificação da insolvência como culposa, presumindo o legislador – sem admitir prova em contrário – que em tais situações a insolvência é sempre culposa), nas situações previstas no nº 3 apenas se presume a existência de culpa grave, sem dispensa, portanto, da demonstração do nexo causal entre o comportamento – que a lei presume como gravemente culposo – e a criação ou agravamento da situação de insolvência;
  5. Assim, o incumprimento do dever de requerer a declaração de insolvência apenas permite presumir – ao abrigo do disposto no art. 186º, nº 3, alínea b), do CIRE – a existência de culpa grave; para que esse incumprimento possa determinar a qualificação da insolvência como culposa é necessário ainda que se demonstre que o incumprimento desse dever criou ou agravou a situação de insolvência.

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