Fundamentação da decisão da matéria de facto. Erro notório na apreciação da prova. Princípio da livre apreciação da prova. Impugnação ampla da matéria de facto. In dubio pro reo. Recurso da parte cível

FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO. ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA. PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. IMPUGNAÇÃO AMPLA DA MATÉRIA DE FACTO. IN DUBIO PRO REO. RECURSO DA PARTE CÍVEL
RECURSO CRIMINAL Nº
771/15.0PAMGR.C1
Relator: HELENA BOLIEIRO
Data do Acordão: 13-06-2018
Tribunal: LEIRIA (J C GENÉRICA DA MARINHA GRANDE – J2)
Legislação: ARTS. 127.º, 374.º, 400.º, 410.º E 412.º DO CPP; ARTS. 32.º E 205.º DA CRP
Sumário:

  1. O imperativo constitucional da fundamentação (artigo 205.º, n.º 1, da CRP) assume no processo penal uma função estruturante das garantias de defesa do arguido.
  2. Pela fundamentação da decisão da matéria de facto, é assegurado o conhecimento das razões factuais e jurídicas por que foi tomada uma decisão e não outra, de modo a facultar a opção reactiva (impugnatória ou não) adequada à defesa dos seus direitos e revelando-se, assim, essencial para o exercício do direito ao recurso.
  3. A indicação e exame crítico da prova que serviu para formar a convicção, num formato tanto quanto possível completo, deve dar a conhecer com suficiência bastante o percurso lógico e racional efectuado pelo julgador em sede de apreciação e valoração da prova que conduziu à demonstração da factualidade objecto da decisão recorrida.
  4. No erro notório da apreciação da prova está em causa, não o conteúdo da prova em si, nomeadamente do que foi dito no depoimento ou nas declarações prestadas, cujo teor se aceita, mas a utilização que foi dada à referida prova, no sentido de a mesma suportar a demonstração de um determinado facto.
  5. O princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127.º do CPP, determina que, salvo existência de prova vinculada ou tarifada (como é o caso da pericial, face ao valor que lhe é reconhecido no artigo 163.º, n.º 1, do CPP), o tribunal decide quanto ao mais de acordo com as regras da experiência e a livre convicção.
  6. Na motivação da decisão de facto é bastante a fundamentação da sentença recorrida quando o tribunal a quo elencou as razões da valoração que efectuou, identificando a prova por declarações, testemunhal, pericial e documental que relevou na formação da sua convicção e indicando os aspectos da mesma que conjugadamente o levaram a concluir no sentido de considerar demonstrada a factualidade da acusação, para além de ter assinalado de forma lógica e racional os fundamentos que no seu entendimento justificam a credibilidade que reconheceu e peso probatório que conferiu às citadas declarações e depoimento.
  7. A impugnação especificada da matéria de facto não só exige a menção dos pontos de facto concretos em relação aos quais a recorrente entende haver erro de julgamento, como a indicação das provas concretas que na sua perspectiva impõem uma decisão em sentido diverso da tomada pelo tribunal a quo.
  8. Em sede de recurso, o uso feito do princípio in dubio pro reo afere-se pelo texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sendo que quando daí resultar que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que, face a ele, optou pelo sentido desfavorável ao arguido, se impõe concluir que ocorreu violação daquele princípio.
  9. O recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada. 

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