Crime de violência doméstica; Suspensão da execução da pena de prisão; Regras de conduta; Proibição de contacto protecção dos direitos da vítima; Controlo por meios electrónicos da proibição de contactos e de aproximação à vitima de violência doméstica

CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA; SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO; REGRAS DE CONDUTA; PROIBIÇÃO DE CONTACTO PROTECÇÃO DOS DIREITOS DA VÍTIMA; CONTROLO POR MEIOS ELECTRÓNICOS DA PROIBIÇÃO DE CONTACTOS E DE APROXIMAÇÃO À VITIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

RECURSO CRIMINAL Nº  246/22.0GASEI.C1
Relator: ALCINA COSTA RIBEIRO
Data do Acórdão: 12-07-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE GOUVEIA
Legislação: ARTIGOS 34º-B E35.º, N.º 5, DA LEI N.º 112/2009, DE 16 DE SETEMBRO/REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E À PROTECÇÃO E ASSISTÊNCIA DAS SUAS VÍTIMAS; ARTIGOS 50.º, 51.º, 52.º, E 55.º A 57.º DO CÓDIGO PENAL/C.P.

Sumário:

I – A suspensão da execução da pena de prisão tem como objectivo de política criminal o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer «correcção», «melhora» ou, ainda menos, «metanóia» das concepções daquele sobre a vida e o mundo.

II – A suspensão da execução da pena não depende, apenas e só, da formulação de um juízo de prognose favorável radicado exclusivamente em considerações de prevenção especial de socialização, exigindo, também, que à suspensão não se não oponham, em absoluto, as necessidades de prevenção e reprovação do crime.

III – As regras de conduta que podem condicionar a suspensão da execução da pena são determinadas em função da imagem global dos factos, devem ser adequadas e proporcionais às exigências de prevenção geral e especial exigidas no caso concreto e às concretas necessidades de protecção da vitima, destinam-se a promover a reintegração do condenado na sociedade, evitando o cometimento de futuros de crimes, e não podem, em caso algum, representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir .

IV – Para o legislador, a suspensão da execução da pena de prisão pela prática de um crime de violência doméstica só acautelará as finalidades preventivas, geral e especial, se condicionada às regras de conduta de protecção das vitimas especialmente previstas no artigo 34.º-B do Regime Jurídico aplicável à Prevenção da Violência Doméstica, que consagra um regime especial de suspensão da execução que se sobrepõe ao regime geral regulado no artigo 51.º e 52.º do Código Penal.

V – A proibição de contactos e de aproximação do agressor à vitima constituem um dos meios para, por um lado, assegurar a protecção e segurança das vítimas e diminuir o seu risco de revitimização, uma vez que as vítimas deste tipo de crime correm o risco acrescido de intimidação, retaliação e vitimização secundária ou repetida, requerendo especial atenção e necessidade de protecção, e, por outro, permitir que o arguido interiorize a ilicitude da sua conduta.

VI – A determinação da medida de afastamento da vitima tem que ter em consideração a factualidade provada, nomeadamente as condições pessoais do agente, de modo a não frustrar, de um lado, os efeitos pedagógico e educativo que se pretendem extrair da medida, de promoção da reintegração do agente na sociedade, e, por outro, a protecção da vitima.

VII – O controlo por meios electrónicos da proibição de contactos e de aproximação à vitima pode ser imposto, nos termos dos artigos 35.º e 36.º, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, como regra de conduta condicionante da suspensão da prisão (artigos 34.º B da Lei n.º 112/2009 e 52º do C.P.), como pena acessória (artigo 152.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.), como injunção e regra de conduta na suspensão provisória do processo (artigo 281.º do C.P.P.), e como medida de coacção urgente (artigo 31º da Lei 112/2009, de 16 de Setembro).

VIII – A revogação, alteração e extinção das medidas de afastamento fiscalizadas por meios técnicos de controlo à distância, quando aplicadas por efeito da suspensão da prisão, estão sujeitas ao regime geral aplicável aos deveres e às regras de conduta estabelecidas nos artigos 55.º a 57.º do C.P., nos termos do artigo 35º, n.º 5, da Lei 112/2009, de 16 de Setembro.

IX – A utilização dos meios técnicos de controlo à distância, enquanto instrumentos de fiscalização do cumprimento das medidas de proibição e imposição de condutas fixadas em contexto de violência doméstica, depende da verificação de um concreto juízo de essencialidade/imprescindibilidade para a protecção da vitima, do consentimento do arguido, da vitima, das pessoas que vivam com o arguido e das pessoas que possam ser afectadas pela permanência obrigatória do arguido em determinado local, ou da dispensa judicial do consentimento das pessoas que o devam prestar, sempre se mostre imprescindível o uso de tais meios para a protecção da vitima.

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