Crime de violência doméstica. Pessoa particularmente indefesa em razão da idade e doença. Suspensão da execução da pena de prisão
CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PESSOA PARTICULARMENTE INDEFESA EM RAZÃO DA IDADE E DOENÇA. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO
RECURSO CRIMINAL Nº 1153/21.0T9FIG.C1
Relator: JOSÉ EDUARDO MARTINS
Data do Acórdão: 11-09-2024
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE COIMBRA – JUIZ 3
Legislação: O ARTIGO 50.º DO CÓDIGO PENAL
Sumário:
I – A suspensão da execução da pena só tem lugar quando for possível fazer um juízo de prognose favorável ao arguido e não deve ser utilizada se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime.
II – Revestindo a inexistência de antecedentes criminais a obrigação de qualquer cidadão, a primariedade não reveste excepcionalidade para justificar, sempre, a aplicação da suspensão da execução da pena.
III – Revelam uma enorme ilicitude e uma personalidade deformada, cruel e sem qualquer empatia pelo próximo, o facto de a arguida, única familiar do ofendido, seu pai, nascido em 13-2-1934, que, devido à idade muito avançada e doenças incapacitantes de que padecia, estava completamente dependente do auxílio de terceiros, situação que a arguida bem conhecia, ter deixado de o visitar e lhe telefonar desde 29-4-2020, data da morte da mãe, até à morte deste, ocorrida em 31-3-2024, ter deixado de o acompanhar a consultas médicas, não providenciar pela alimentação e higiene sua pessoal, pela limpeza da habitação, pela lavagem da roupa, e pelo pagamento das contas da água, da electricidade e do gás a partir de certa altura, não providenciar pela contratação de instituição ou terceira pessoa que prestasse ao seu pai os referidos apoios, recusando o pagamento de tais serviços, recusando a intervenção de qualquer entidade de apoio social, alegando ser essa intervenção completamente desnecessária, e, a partir de 9-6-2020, data da emissão do cartão bancário associado à conta que o pai tinha, emitido em nome da arguida, cotitular da conta, ter passado a usar em exclusivo proveito próprio as quantias de 320,68 € e de 390,53 €, mensalmente depositadas a titulo de pensões recebidas pelo ofendido.
IV – Sendo a arguida licenciada em psicologia, não tendo mostrado qualquer arrependimento, não assumindo os actos que praticou e não revelando qualquer capacidade de autocrítica, não é possível qualquer juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena.