Fiança. Características. Benefício da excussão prévia. Excepções
FIANÇA. CARACTERISTICAS. BENEFÍCIO DA EXCUSSÃO PRÉVIA. EXCEPÇÕES
APELAÇÃO Nº 4081/06.5YXLSB.C1
Relator: DR. ISAÍAS PÁDUA
Data do Acordão: 07-10-2008
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCOBAÇA – 1º JUÍZO
Legislação Nacional: ARTºS 627º, 638º E 640º, ALS. A) E B), DO C.CIV.; 101º DO CÓDIGO COMERCIAL
Sumário:
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Como é sabido, para além das simples garantias gerais (tendo por objecto o património do devedor) comuns a todos os credores, podem ainda estes exigir a fixação de outras garantias específicas tendentes a salvaguardar os seus interesses no caso de incumprimento das obrigações estabelecidas pela parte com a qual contrataram.
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Garantias especiais essas que podem assumir a natureza real ou pessoal.
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As garantias pessoais são aquelas em que através delas outras pessoas, além do devedor, ficam responsáveis, com o seu património, pelo cumprimento da obrigação.
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Entre essas garantias específicas ou especiais destaca-se, como sua figura-tipo, a fiança, cujo regime geral se encontra plasmado nos artºs 627º e ss do C. Civil.
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Figura essa que, em termos jurídicos, se costuma definir e conceptualizar como o vínculo jurídico pelo qual um terceiro (fiador) se obriga pessoalmente perante o credor, garantindo com o seu património a satisfação do direito de crédito deste sobre o devedor.
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São duas as características que essencialmente definem tal figura contratual: a acessoriedade e a subsidiariedade.
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A acessoriedade, como primeiro desses traços caracterizadores (o mais essencial dos dois), encontra a sua expressão no nº 2 do artº 627º do C.C., e, grosso modo, pode dizer-se que consiste no facto de a fiança ficar subordinada a acompanhar a obrigação afiançada, com as consequências que se encontram fixadas nos artºs 628º, 631º, 632º, 634º, 637º e 651º, todos daquele mesmo diploma legal.
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Por sua vez, grosso modo, podemos dizer que a subsidiariedade (que não pode ser vista de forma totalmente isolada daquela primeira característica) é um benefício estabelecido exclusivamente a favor do fiador (do qual pode lançar mão, a par de outros meios de defesa colocados ao dispor do afiançado e que estão ligados à característica da acessoriedade) e que se traduz no princípio segundo o qual o fiador só responderá pelo pagamento da obrigação se e quando se provar que o património do devedor (afiançado) é insuficiente para a solver.
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Por outras palavras, a subsidiariedade concretiza-se no chamado benefício de excussão, o qual, por sua vez, consiste no direito que o fiador tem de recusar o cumprimento da obrigação enquanto não estiverem executidos todos os bens do devedor principal.
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Princípio esse que se encontra consagrado no artº 638º do C.C., ao estipular-se ali que “ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver executido todos os bens do devedor sem obter a satisfação do seu crédito (nº 1), podendo ainda, inclusive, o fiador continuar a recusar o seu cumprimento, mesmo para além dessa excussão, se provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor (cfr. nº 2 de tal normativo).
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Muito embora tal princípio (de subsidiariedade) seja a regra na fiança, todavia, ele comporta excepções, como ocorre nas situações previstas nas als. a) e b) do artº 640º do C.C., destacando-se aqui a referida naquela primeira alínea e que tem lugar sempre que o fiador houver renunciado (de forma expressa ou tácita) a tal benefício e, em especial, se tiver assumido a obrigação de principal pagador.
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Como outro tipo de excepções (especialmente previstas) convém destacar aquela situação que decorre da previsão do artº 101º do Código Comercial, onde se prevê e estipula que “todo o fiador de obrigação mercantil, ainda que não seja comerciante, será solidário com o respectivo afiançado”.
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Daí resulta que em tal situação (tal como sucede com as situações de excepção previstas no citado artº 640º do CC) o fiador não goza também do benefício de excussão prévia – havendo mesmo quem afirme que nessa particular situação vigora aí o regime de solidariedade passiva (ainda que porventura imperfeita), podendo o credor demandar tanto fiador como o afiançado, sozinhos ou conjuntamente, sem que o primeiro se possa recusar a cumprir sem estar executido (todo ou em parte) o património do último, sendo certo que no caso de cumprir pode depois vir a exigir do afiançado tudo o que pagou.