Alteração substancial dos factos. Nulidade da sentença
ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS. NULIDADE DA SENTENÇA
RECURSO CRIMINAL Nº 791/16.7PBLRA.C1
Relator: CRISTINA BRANCO
Data do Acórdão: 22-03-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE LEIRIA – JUIZ 1
Legislação: ARTIGOS 1.º, N.º 1, ALÍNEA F), 358.º, 359.º E 379.º, N.º 1, ALÍNEA B), DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Sumário:
I – O artigo 358.º do Código de Processo Penal consagra uma comunicação que incumbe ao tribunal fazer, que transmite um juízo necessariamente provisório, que, depois de sujeito ao contraditório prescrito no preceito, terá ou não projecção na decisão da matéria de facto fixada na sentença ou acórdão que vier a ser proferido.
II – Dada a sua natureza provisória, a comunicação em causa não afecta, em si mesma, os direitos do arguido, razão pela qual a lei não estabelece qualquer sanção para a sua omissão em momento anterior ao da prolação da sentença.
III – O tribunal está vinculado ao thema decidendum definido pela acusação ou pela pronúncia, que deve manter-se inalterado até ao trânsito em julgado da condenação, como forma de assegurar a plenitude da defesa, garantindo ao arguido que apenas tem de defender-se dos factos acusados e não de outros e que apenas por esses factos poderá ser condenado, mas tal não impede que o tribunal, na sua actividade cognoscitiva e decisória, atenda a factos que não foram objecto da acusação, sejam quais forem as circunstâncias.
IV – Se no decurso da audiência se verificar uma alteração substancial ou não substancial dos factos descritos na acusação, o tribunal pode deles conhecer desde que ocorrida nos casos e condições previstos nos artigos 358.º e 359.º do Código de Processo Penal.
V – Em cada caso há que determinar se ocorre uma alteração de factos, ocorrendo há que verificar, depois, se ela é substancial ou não substancial e, perante essa definição, desencadear os mecanismos legais previstos para assegurar o exercício dos direitos de defesa.
VI – A alteração substancial dos factos pressupõe uma diferença de identidade, de grau, de tempo, ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, determinando a reformulação do objecto do processo, operada pelo acordo dos sujeitos processuais com vista à rápida resolução do litígio, tudo sem intervenção do julgador e, portanto, sem trair o princípio do acusatório.
VII – A alteração de factos que desencadeia a necessidade de comunicação a que alude o artigo 358.º, n.º 1, do Código de Processo tem que ser relevante, o que sucede quando essa modificação divirja do que se encontra descrito na acusação ou na pronúncia e a subsequente comunicação se mostre útil à defesa.
VIII – Não existe alteração dos factos integradora do artigo 358.º quando a factualidade dada como provada no acórdão condenatório consiste numa mera redução daquela que foi indicada na acusação ou na pronúncia, por não se terem dado como assentes todos os factos aí descritos, quando na sentença são descritos os mesmos factos da acusação ou da pronúncia com uma formulação distinta, ou quando se explicitam, pormenorizam ou concretizam factos, já narrados sinteticamente na acusação ou na pronúncia, que não sejam relevantes para a tipificação ou para a verificação de qualquer agravante qualificativa.