Usucapião. Servidão de vistas. Janelas. Conceito jurídico
USUCAPIÃO. SERVIDÃO DE VISTAS. JANELAS. CONCEITO JURÍDICO
APELAÇÃO Nº 335/13.2TBAGN.C1
Relator: ALEXANDRE REIS
Data do Acordão: 03-03-2015
Tribunal: COMARCA DE COIMBRA – ARGANIL – SECÇÃO COMP. GENÉRICA
Legislação: ARTºS 1326º, 1363º E 1364º DO C. CIVIL.
Sumário:
- O problema que coloca a detecção e correcção de pontuais e concretos erros de julgamento é o da aferição da razoabilidade da convicção probatória do julgador, à luz das regras da ciência, da experiência e da probabilidade lógica prevalecente, o que implica que a alteração pela relação do julgamento da 1ª instância se limite aos casos de patente irrazoabilidade, aqueles em que os elementos em que tal julgamento se fundamentou são inidóneos para o efeito, à luz das mencionadas regras.
- Não devem as restrições ao gozo, tendencialmente pleno, dos direitos de uso, fruição e disposição da coisa sobre que incide o direito de propriedade ser ampliadas a obras cuja semelhança com as expressamente individualizadas na lei seja de afastar ou se apresente bastante duvidosa.
- Tendo em mente a natureza excepcional da restrição imposta pelo art. 1362º do CC, só será suficiente para o preenchimento do corpus e do animus necessário à posse conducente à constituição da servidão de vistas por usucapião a manutenção de “janela”, com condições de através dela se poder ver, devassar e ocupar o espaço aéreo do prédio vizinho, sobre ele se debruçando ou projectando a parte superior do corpo humano.
- Devem ser concebidas como irregulares as aberturas semelhantes a “frestas” e “janelas gradadas” mas com dimensões superiores e/ou situadas a uma altura inferior às indicadas, respectivamente, nos arts. 1363º e 1364º do CC– e que, nos termos anteriormente expostos, também não possam ser qualificadas como “janelas”.
- A edificação e manutenção dessas aberturas irregulares, sem as características indicadas nos arts. 1363º e 1364º do CC, excedem o conteúdo do direito de propriedade e sujeitam o proprietário vizinho a um encargo a que este se pode opor, exigindo que as aberturas sejam afeiçoadas às condições (dimensão e afastamento do solo ou sobrado) impostas na lei. Se o proprietário vizinho não se insurgir contra o abuso cometido, a posse das utilidades daí resultantes pode originar a aquisição, por usucapião, de uma servidão predial, embora não de uma servidão de vistas atípica.
- E uma vez constituída essa servidão predial, o dono do prédio dominante adquire o direito de manter essas aberturas em condições irregulares, cessando o direito de o proprietário vizinho exigir a sua harmonização com a lei, mas este não perde o direito de construir até à linha divisória, mesmo que tape as aberturas, porque a restrição que cria uma zona non aedificandi, no espaço de metro e meio, só é estabelecida em relação à servidão de vistas regulada no art. 1362º.