Tutela da personalidade. Cumulação de pedidos. Excesso de pronúncia. Direito ao repouso. Ao sono e tranquilidade. Direito de exploração de uma actividade económica
TUTELA DA PERSONALIDADE. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. EXCESSO DE PRONÚNCIA. DIREITO AO REPOUSO. AO SONO E TRANQUILIDADE. DIREITO DE EXPLORAÇÃO DE UMA ACTIVIDADE ECONÓMICA
APELAÇÃO Nº 247/19.6T8FVN.C1
Relator: CRISTINA NEVES
Data do Acórdão: 28-06-2022
Tribunal: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE FIGUEIRÓ DOS VINHOS DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Legislação: ARTIGOS 17.º, 18.º, 25.º, 64.º, N.º 1 E 66.º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, ARTIGOS 3.º E 25.º DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM, ARTIGOS 37.º, 547.º, 555.º, 878.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ARTIGOS 70.º, 165.º E 335.º, DO CÓDIGO CIVIL, E ARTIGOS 2.º E 22.º DA LEI N.º 11/87, DE 7-04.
Sumário:
I – O lesado, na defesa dos seus direitos de personalidade, pode optar ou pela interposição de uma acção comum que, em cumulação com o pedido de cessação da ofensa cometida, permita a obtenção de uma indemnização pela violação dos seus direitos ou pelas providências urgentes de tutela da personalidade a que corresponde a forma de processo especial.
II- Não existe excesso de pronúncia quando, improcedendo o pedido principal de encerramento de estabelecimento comercial por ofensa a direitos de personalidade, se decidiu pela restrição do horário de laboração do estabelecimento, por constituir um minus em relação a este pedido e ainda por se enquadrar nos pedidos subsidiários formulados de que o tribunal teria de conhecer.
III – O direito à integridade física, ao repouso e à saúde, consagrado no artº 24 da Constituição, é um direito absoluto beneficiando do regime dos direitos liberdades e garantias protegidos pelos artºs 17 e 18 da Constituição.
IV – O direito de exploração económica de uma actividade constitui um direito económico, que só pode ser exercido “nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral” (nº1 do artº 61), não constituindo assim um direito absoluto.
V- Em caso de colisão deste direito com direitos absolutos de personalidade, prevalecem estes últimos, conforme decorre do disposto no artº 335 nº2 do C.C.
VI – O ruído provocado por música e conversas de um estabelecimento de café/pub, que impede o sono e o descanso de quem habita em frente deste estabelecimento, constitui uma violação de um direito de personalidade, mesmo que o nível de ruído não exceda os limites fixados no Regulamento Geral de Ruído.
VII – A restrição do horário de laboração do estabelecimento para as 22 horas nos dias de semana e as 24 horas nas sextas-feiras, sábados e vésperas de feriados e a insonorização deste estabelecimento constituem mediadas adequadas e proporcionais à tutela dos direitos de personalidade, sem impossibilitarem o direito ao exercício de uma actividade económica.
VIII – -O licenciamento de actividade comercial e o cumprimento de regras administrativas pelos estabelecimentos comerciais não isenta os respectivos gerentes dos deveres de prevenção de ruídos que afectem o direito ao descanso e ao sossego de quem habita nas proximidades, incorrendo estes em responsabilidade civil extra-contratual pelos danos causados pela actividade em causa.