Sociedade comercial. Administradores. Desconsideração da personalidade colectiva. Enriquecimento sem causa

SOCIEDADE COMERCIAL. ADMINISTRADORES. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE COLECTIVA. ENRIQUECIMENRO SEM CAUSA
APELAÇÃO Nº
473/13.1TBOHP.C1
Relator: LUÍS CRAVO
Data do Acordão: 09-01-2017
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JUÍZO COMÉRCIO – JUIZ 2
Legislação: ARTS.5, 64, 72, 78, 82, 84 CSC, 334, 474 CC
Sumário:

  1. No exercício das suas funções os gerentes e/ou administradores são responsáveis pelos danos que, com preterição dos deveres legais ou contratuais (contrato de administração) causem, nomeadamente para com a própria sociedade (cf. art. 72.º, n.º 1, do C. Soc. Comerciais).
  2. De entre os deveres a que estão adstritos, os gerentes estão vinculados à observância dos deveres de diligência (definido em função de um padrão objectivo, de um gestor criterioso e ordenado), e de cuidado e lealdade, sendo que ao dever de lealdade costuma ser associado nomeadamente a obrigação de não actuação em conflito de interesses com a sociedade protegida, maxime de não apropriação de património societário desta.
  3. O recurso ao instituto da desconsideração da personalidade colectiva é possível quando ocorram situações de responsabilidade civil assentes em princípios gerais ou em normas de protecção, nomeadamente dos credores, ou em situações de abuso de direito e não exista outro fundamento legal que invalide a conduta do sócio ou da sociedade que se pretende atacar, ou seja, a desconsideração tem carácter subsidiário.
  4. Ou seja, admite-se, embora só excepcionalmente, a responsabilidade dos sócios ou membros dos órgãos sociais perante os credores sociais, outros sócios ou até terceiros, quando aqueles utilizem a pessoa colectiva para um fim contrário ao direito.
  5. Se de acordo com o art. 474º do C. Civil o empobrecido só pode socorrer-se das regras do enriquecimento sem causa quando a lei não faculte aos empobrecidos outros meios de reacção, sucede que esta regra da subsidiariedade não é absoluta, pois que, conforme nos ensina a melhor doutrina, é manifesto que a ação de enriquecimento poderá concorrer com a responsabilidade civil, sempre que esta não atribua uma proteção idêntica à ação de enriquecimento.
  6. Sem embargo, para que a regra da subsidiariedade não impeça que se exercite o direito à restituição, é necessário que haja uma divergência de valores entre o que o lesado/empobrecido obteria por um ou outro meio, assim se justificando o recurso ao meio complementar, ou então uma insuficiente cobertura pela via da indemnização, para se lançar mão do pedido de restituição, mas tanto quanto é possível alcançar, estando sempre em causa o mesmo devedor e não devedores distintos.
  7. Por outro lado, legitima-se neste particular e para este efeito a restituição à luz do instituto do enriquecimento sem causa, quando, e só quando, a originária via (indemnizatória) não subsiste ou já deixou de existir, obviamente não bastando uma situação hipotética (receio de não pode vir a ser efetivada a via indemnizatória, ou de vir ela a revelar-se insuficiente).

Consultar texto integral