Responsabilidade contratual. Contrato de depósito. Reparação de veículo. Restituição. Princípio da boa fé

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. CONTRATO DE DEPÓSITO. REPARAÇÃO DE VEÍCULO. RESTITUIÇÃO. PRINCÍPIO DA BOA FÉ
APELAÇÃO Nº
96/14.8TBSRE.C1
Relator: VÍTOR AMARAL
Data do Acordão: 20-06-2017
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JL CÍVEL – JUIZ 2
Legislação: ARTS.227, 762, 799, 1185, 1186, 1187 CC
Sumário:

  1. Se uma das partes entrega a outra um veículo automóvel para deteção de avaria, orçamentação de reparação e eventual reparação – esta a ser decidida em função dos custos que fossem orçamentados –, ocorre contrato de depósito, com natureza instrumental/preliminar relativamente ao eventual contrato de empreitada de reparação.
  2. Se o depositário, não entregando o orçamento acordado, depois de desmontado parcialmente o motor do veículo, esclarece, todavia, que se trata de avaria no motor, que obriga à respetiva reconstrução ou substituição, incorre em defeituosa prestação de informação, que não é geradora de danos se a finalidade informativa do orçamento foi alcançada, por ter permitindo à contraparte decidir-se pela não reparação.
  3. O depositário está obrigado a restituir a coisa quando lhe for exigida e no estado em que a recebeu, obrigação a ser perspetivada segundo um critério de razoabilidade/proporcionalidade e de justiça contratual, à luz do princípio da boa-fé.
  4. Este princípio revela determinadas exigências objetivas de comportamento – de correção, honestidade e lealdade – impostas pela ordem jurídica, exigências essas de razoabilidade, probidade e equilíbrio de conduta, em campos normativos onde podem operar subprincípios, regras e ditames ou limites objetivos, postulando certos modos de atuação ao longo de toda a execução do contrato e liquidação da relação.
  5. Cabe ao R. (depositário) o ónus da alegação e prova da impossibilidade não imputável de restituição do bem no estado em que lhe havia sido entregue, por se tratar de matéria de exceção invocada.
  6. Não tendo o depositário procedido à remontagem do motor da viatura, é de ter por irrazoável/desproporcionada a exigência de reconstrução ou substituição do motor ou a indemnização, a expensas daquele, medida pelo valor de mercado de viatura semelhante, se o depositante, perante vício pré-existente do motor, não imputável ao depositário, havia já optado pela não reparação.
  7. A remontagem do motor defeituoso, como obrigação do depositário, configurar-se-ia como um procedimento inútil, pois não supriria o comprometedor defeito pré-existente, não logrando satisfazer o interesse do depositante e onerando excessivamente, sem qualquer retorno, a posição da contraparte.
  8. Em tal caso, é adequado impor ao depositário a entrega, a expensas suas, do veículo no domicílio do depositante, não sendo exigível a este indemnização por ocupação do espaço da oficina onde a viatura foi guardada.

Consultar texto integral