Regime jurídico de proteção de crianças e jovens em perigo. LPCJP. Objetivo. Conceito de criança ou de jovem em perigo. Medidas de proteção

REGIME JURÍDICO DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO LPCJP. OBJETIVO. CONCEITO DE CRIANÇA OU DE JOVEM EM PERIGO. MEDIDAS DE PROTEÇÃO
APELAÇÃO Nº 4397/18.8T8PBL.C1
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Data do Acordão: 23-03-2021
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE POMBAL
Legislação: LEI Nº 147/99, DE 01/09; ARTº 1918º DO C. CIVIL.
Sumário:

  1. A Lei nº. 147/99, de 1/9, que aprovou a lei ou o regime jurídico de proteção de crianças e jovens em perigo (designada por LPCJP) teve e tem precisamente como objetivo a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo, por forma a garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral (artº. 1º), aplicando-se a todas as crianças e jovens que se encontrem em tal situação e residam ou se encontrem em território nacional (artº. 2º).
  2. Visando legitimar ou justificar tal intervenção, dispõe o artº. 3º, nº. 1, que “a intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo”.
  3. Como é sabido, o conceito de “criança ou jovem em perigo” adotado em tal normativo foi inspirado no artº. 19º da OTM (entretanto revogado) e no artº 1918º do C. Civil (CC).
  4. Como decorre de tal preceito legal, para que situação de perigo ali prevista ocorra não se torna sequer necessário que tenha havido lugar a uma efetiva lesão de alguns dos “bens ou valores” ali referidos, bastando tão só que esteja criada uma situação de facto que seja realmente potenciadora desse perigo de lesão, ou seja, tal normativo basta-se com a criação de um real ou muito provável perigo, ainda longe de dano sério.
  5. Num esforço de concretização, o legislador, embora de forma exemplificativa ou não taxativa, passou, através do nº. 2. do citado artº. 3º, a elencar algumas das situações que devem ser consideradas como configurando uma situação em que a criança ou jovem está perigo, reclamando a intervenção do Estado (direta ou indiretamente) com vista a removê-lo.
  6. Entre elas, e com interesse para o caso sub júdice, encontram-se aquelas situações em que a criança ou jovem “não recebe os cuidados ou afeição adequados a sua idade e situação pessoal” (al. c)) ou “está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional” (al. f)).
  7. As situações de perigo ali contempladas tanto podem provir de culpa (no sentido lacto sensu) dos pais, do representante legal, daquele que tenha a criança ou jovem à sua guarda de facto ou de ação ou omissão de terceiros (além da própria criança), como resultar inclusive de simples impotência ou incapacidade daqueles.
  8. Convém ainda sublinhar que no artº. 4º se encontram enunciados os diversos princípios porque se deve nortear ou orientar qualquer intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e jovem em perigo, aparecendo acima de todos eles o interesse superior da criança e do jovem, e ao qual se deve atender prioritariamente. Princípio esse que, aliás, já se encontra plasmado na acima aludida Convenção sobre os Direitos da Criança (cfr. artºs 3º, nº. 1, e 9º, nº. 1).
  9. Com vista, por um lado, a remover a situação de perigo em que se encontre o menor, e, por outro, a atingir o tal interesse superior do mesmo, foram criadas uma série de medidas (de promoção e proteção), que tanto podem ser aplicadas a título definitivo como a título provisório, e que se encontram elencadas no artº. 35º, e dais quais destacamos, por ter a ver com o caso em apreço, “a confiança (…) a instituição com vista a futura adoção” (nº. 1 al. g)). Em sintonia, e com vista à aplicação dessa medida, vide ainda o artº. 1978º do CC, e particularmente os seus nºs. 1, al. d) e e), 2 e 3.
  10. O ideal é que as crianças cresçam sempre no seio de uma família, e sobretudo ao lado dos seus pais e dos seus irmãos (quando existem).
  11. Mas tal princípio (que não é absoluto) pressupõe não só que exista essa família (e estamos agora a referirmo-nos à família biológica, pois que a outra legal, que poderá advir da adoção, neste momento ainda não existe) mas, e sobretudo, também que exista um ambiente familiar propício a permitir a integração e o crescimento dos menores no seu seio, e muito particularmente que os pais disponham de condições (quer ao nível afetivo, quer ao nível psicológico, quer ao nível económico) para tratar e cuidar deles e lhe proporcionar esse crescimento/desenvolvimento em termos harmoniosos (ainda que porventura com a ajuda/apoio do Estado, através das suas instituições vocacionadas para o efeito, sendo certo que foi justamente para esse efeito que entre o elenco das medidas legais de promoção e proteção se encontra a do “apoio junto dos pais” – cfr. al. a) do nº. 1 do citado artº. 35º, nº. 1).

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