Recurso. Impugnação de facto. Ónus de especificação. Rejeição do recurso. Ação de despejo. Compropriedade. Legitimidade ativa. Litisconsórcio voluntário. Confissão. Dívida em prestações. Vencimento. Interpelação

RECURSO. IMPUGNAÇÃO DE FACTO. ÓNUS DE ESPECIFICAÇÃO. REJEIÇÃO DO RECURSO. ACÇÃO DE DESPEJO. COMPROPRIEDADE. LEGITIMIDADE ACTIVA. LITISCONSÓRCIO VOLUNTÁRIO. CONFISSÃO. DÍVIDA EM PRESTAÇÕES. VENCIMENTO. INTERPELAÇÃO
APELAÇÃO Nº 1093/19.2T8CTB.C1
Relator: MOREIRA DO CARMO
Data do Acordão: 08-09-2020
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – C.BRANCO – JC CÍVEL – JUIZ 1
Legislação: ARTS. 32, 33, 607, 610, 640 CPC, 353, 781, 804, 985, 1038, 1405 CC
Sumário:

  1. O que se impugna, quando se ataca a decisão da matéria de facto proferida pelo julgador, como decorre do art. 640º, epígrafe e seu nº 1, do NCPC, são factos, constantes da decisão sobre tal matéria, e não as questões que a julgadora elencou, em observância ao que a lei comanda no art. 607º, nº 2, do NCPC, e que a sentença terá que solucionar;
  2. Se a recorrente defende existir contradição entre a factualidade apurada e a fundamentação jurídica e respectiva decisão proferida, então estaremos perante um erro no julgamento de direito – má aplicação do direito aos factos apurados -, mas jamais perante um vício da decisão da matéria de facto;
  3. Quando se impugna a matéria de facto, tem de observar-se os ditames do art. 640º, nº 1, a) a c), e nº 2, a), do NCPC, designadamente os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda;
  4. A omissão desse ónus, imposto no referido artigo, implica a rejeição do recurso da decisão da matéria de facto, não se satisfazendo o mesmo com a menção que a declaração de parte está gravada no sistema digital, ou com a indicação do início aos … e termo aos … (sendo que no caso nem existe transcrição de tais declarações);
  5. Sobre este último ónus, o texto da lei e a sua interpretação histórico-actualista, repudiam interpretações facilitistas, que no fundo degeneram em violação: do princípio da igualdade das partes – ao não tratar diferentemente o cumprimento ostensivamente defeituoso da lei adjectiva, pois se há partes que podem cumprir esse ónus e o cumprem, porque razão se haveria de dar igual tratamento a quem não o faz ! -; do princípio do contraditório – por impor à parte contrária um esforço excessivo e não previsto na tarefa de defesa, imputável ao transgressor -; e do princípio da colaboração com o tribunal – por razões análogas, mas reportadas ao julgador;
  6. Sendo de rejeitar, também, interpretações complacentes, que se contentam com a indicação do depoimento e identificação de quem o prestou, sem obrigatoriedade de transcrição; com a fixação electrónica/digital do início e fim dos depoimentos e a transcrição dos excertos relevantes; já que a não ser assim há excesso de formalismo que a dogmática processual rejeita; a não ser assim não se respeita o princípio da proporcionalidade.
  7. Na verdade, a 1ª interpretação faz tábua rasa do texto legal, relevando dois elementos que a lei não enumerou e “apagando” a passagem nuclear do texto legal “indicação com exactidão das passagens da gravação”; a 2ª interpretação, obnubila também tal trecho legal, pois que apenas releva o fim e início da gravação, acabando por não observar o cumprimento do verdadeiro requisito legal, e por outro lado, passa a requisito de cumprimento obrigatório um elemento – a transcrição dos excertos relevantes – que a lei expressamente vê como facultativo; a 3ª interpretação, não contém objecção de relevo pois a exigência de formalismo nada tem de extraordinário, como o tribunal constitucional já sinalizou; e na 4ª interpretação não se divisa ofensa da exigência de proporcionalidade, pois que, na sua tridimensionalidade de onerosidade, dificuldade e gravidade das consequências, o cumprimento rigoroso da lei, quanto ao indicado requisito de impugnação da matéria de facto, não é oneroso e é de fácil execução, não sendo anómala, no seu incumprimento, a respectiva rejeição do recurso;
  8. Como decorre dos arts. 1405º, nº1, e 985º, nº 1, do CC, a acção de despejo, na falta de convenção em contrário, pode ser proposta por qualquer um dos comproprietários; o que quer dizer que estamos perante uma situação de litisconsórcio voluntário e não perante um litisconsórcio necessário legal (vide arts. 32º e 33º, nº 1, “a contrario” do NCPC);
  9. Se um dos senhorios/comproprietários/AA confessa um facto desfavorável aos mesmos, nos termos do art. 353º, nº 2, do CC, tal confissão, de litisconsorte voluntário, embora eficaz, e com força probatória plena, restringe-se ao seu interesse, não abarcando e não valendo contra os restantes;
  10. Tendo as partes convencionado que a falta de pagamento de uma prestação implica o vencimento da totalidade da dívida, o vencimento imediato das prestações constitui um benefício que a lei concede (no art. 781º do CC), mas não decreta, ao credor, pelo que o credor deve interpelar o devedor para cumprir toda a obrigação;
  11. Dá-se a interpelação judicial, por parte do credor ao devedor, para pagamento da dívida total, com a citação da R. na acção, considerando-se a partir daí vencida, e podendo, assim, ser exigida à R./devedora (art. 610º, nº 1, b), do NCPC).

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