Queixa. Acusação particular. Poder de direcção. Dolo

QUEIXA. ACUSAÇÃO PARTICULAR. PODER DE DIRECÇÃO. DOLO
RECURSO CRIMINAL Nº
15/12.6GAMMV.C1
Relator: VASQUES OSÓRIO
Data do Acordão: 21-01-2015
Tribunal: MONTEMOR-O-VELHO
Legislação: ARTS. 14.º, 49.º, 50.º, 311.º, 322.º, E 323.º, DO CP
Sumário:

  1. A legitimidade para promover a acção penal nos crimes particulares depende da existência de queixa, da constituição do ofendido como assistente e, finalmente, da dedução de acusação particular.
  2. Só pode ser levado à acusação particular, deduzida em crime de natureza particular, em sentido estrito, o facto transmitido na respectiva queixa, pressuposta a sua relevância jurídico-penal. Quando tal não acontece, quando não existe correspondência – com a amplitude supra delimitada – entre o facto transmitido na queixa e o facto acusado, resta concluir pela não verificação da mencionada condição de procedimento.
  3. Não tendo a questão da condição de procedimento, in casu, da legitimidade para o procedimento, sido conhecida no despacho proferido nos termos do art. 311.º do C. Processo Penal, não existe caso julgado formal sobre ela. Nos termos do disposto no art. 595.º, n.º 3 do C. Processo Civil, aplicável ex vi, art. 4.º do C. Processo Penal, aquele despacho só constituiu caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas.
  4. O assistente/recorrente, com a concreta questão que submete ao conhecimento do tribunal da Relação, não sindica uma qualquer decisão da Mma. Juíza a quo, que tenha revestido uma das duas formas referidas, designadamente, não aponta qualquer erro, nesta sede, à sentença recorrida. Se entendia que tal condução da audiência violava, de alguma forma, os seus direitos de defesa, seria aí, na audiência de julgamento que teria que invocar a nulidade ou irregularidade que entendia estar a ser cometida, cabendo da decisão que sobre ela tivesse recaído o competente recurso. E, se porventura, se tivessem verificado os pressupostos do direito de protesto previsto no art. 75.º, n.º 2 Estatuto da Ordem dos Advogados, haveria tão só que lavrá-lo em acta, com os legais efeitos.
  5. O dolo – o conhecimento e vontade de praticar o facto com consciência da sua censurabilidade [em qualquer das modalidades previstas no art. 14º do C. Penal] – é sempre um facto da vida interior do agente, um facto subjectivo, não directamente apreensível por terceiro e por isso, a sua demonstração probatória, quando não exista confissão, não pode ser feita directamente, designadamente, através de prova testemunhal. Nestes casos, a prova do dolo só pode ser feita por inferência, terá que resultar da conjugação da prova de factos objectivos – em especial, dos que integram o tipo objectivo de ilícito – com as regras de normalidade e da experiência comum.
  6. Se a arguida quis dizer o que disse (chamar vigarista ao assistente), conhecendo o seu significado, as regras da experiência comum, as regras de normalidade impõem a conclusão de que quis imputar, como imputou, ao assistente, aquela qualidade, sabendo, como qualquer cidadão medianamente atento saberia, que ao fazê-lo atentaria contra a honra e consideração àquele devidas.

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