Processo de contra-ordenação. Procedimento administrativo. Direito de defesa. Direito de audiência. Princípio geral de audiência prévia
PROCESSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. DIREITO DE DEFESA. DIREITO DE AUDIÊNCIA. PRINCÍPIO GERAL DE AUDIÊNCIA PRÉVIA
RECURSO CRIMINAL Nº 3140/21.9T8CBR.C1
Relator: HELENA BOLIEIRO
Data do Acórdão: 22-02-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE COIMBRA – JUIZ 3
Legislação: ARTIGO 32.º, N.º 10 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; ARTIGO 50.º DO RGCO, CONSTANTE DO DECRETO-LEI N.º 433/82, DE 27 DE OUTUBRO; ARTIGO 121.º, N.º 1 E 2, E 122.º, N.º 1 E 2, DO CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Sumário:
I – A norma do artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa – introduzida pela revisão constitucional de 1989 quanto aos processos de contra-ordenação e alargada pela revisão de 1997 a quaisquer processos sancionatórios – implica a inviabilidade constitucional da aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defender-se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), reagindo contra uma acusação prévia.
II – O processo de contra-ordenação está sujeito ao reconhecimento de um conjunto de garantias inerentes à respectiva natureza sancionatória, mas tal não o equipara ao processo penal não conduzindo, no plano da aplicação do direito ordinário, à directa transposição de todas e quaisquer regras expressamente previstas para este.
III – Os direitos de defesa e de audiência, concretizados para o processo contra-ordenacional no artigo 50.º do RGCO, determinam que não é permitida a aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória sem se ter assegurado ao arguido a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre.
IV – O processo contra-ordenacional não exige que seja assegurado o princípio geral de audiência prévia aplicável aos procedimentos administrativos, de acordo com o regime ditado pelo respectivo código.
V – Quando, no cumprimento do artigo 50.º do RGCO, a autoridade administrativa introduz no final da notificação o projecto de decisão, a vigorar em caso de inexistência de impugnação, realiza algo que tem paralelo nas citadas normas que regulam o procedimento administrativo, dando a conhecer à arguida o sentido provável da decisão final, que acresce a tudo o mais que indicou na notificação.
VI – Não se trata da afirmação de uma presunção de culpabilidade da arguida, nem da cominação de um efeito não permitido para o silêncio da visada, mas apenas que, face aos elementos recolhidos, considera que cometeu a infracção imputada.
VII – A decisão administrativa comporta um modo sumário de fundamentar, sendo suficiente desde que permita ao coimado perceber o que se decidiu e por que razão assim se decidiu.