Princípio do dispositivo. Factos essenciais nucleares. Factos essenciais complementares. Factos instrumentais. Contrato de arrendamento. Obras. Abuso de direito

PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO. FACTOS ESSENCIAIS NUCLEARES. FACTOS ESSENCIAIS COMPLEMENTARES. FACTOS INSTRUMENTAIS. CONTRATO DE ARRENDAMENTO. OBRAS. ABUSO DE DIREITO
APELAÇÃO Nº
96/14.8TBVZL.C1
Relator: VÍTOR AMARAL
Data do Acordão: 25-10-2016
Tribunal: COMARCA DE VISEU – VISEU – INST. LOCAL – SECÇÃO CÍVEL – J2
Legislação: ARTS.5, 607 CPC, 334, 798, 1031, 1032 CC
Sumário:

  1. Ao abrigo do disposto no art.º 5.º, n.º 2, do NCPCiv., na sentença podem ter assento factos não alegados que, embora ainda essenciais, já não são os nucleares, mas antes complemento ou concretização dos alegados, desde que resultem da instrução da causa e sobre eles tenha havido a possibilidade de as partes se pronunciarem, mesmo que nenhuma delas manifeste vontade de os aproveitar.
  2. Só está, pois, afastada a intervenção oficiosa do tribunal, neste âmbito, quanto aos factos essenciais nucleares (ou principais) – os que constituem a causa de pedir ou que fundam as exceções deduzidas –, continuando aí a manter-se integralmente o princípio do dispositivo.
  3. Já quanto aos demais – factos instrumentais (os substantivamente indiferentes, por não contenderem com o regime substantivo aplicável ao caso), factos essenciais complementares (com papel completador de uma causa de pedir, ou excepção, de natureza complexa, por congregante de diversos elementos) ou concretizadores (na função de pormenorizar ou decompor os factos nucleares, em moldes indispensáveis para a procedência da acção ou da excepção) dos alegados pelas partes –, podendo, mesmo sem alegação, ser atendidos na sentença, ocorre restrição ao princípio do dispositivo, no escopo da obtenção de soluções de justiça material.
  4. Traduzindo a alegação uma declaração de existência (ou inexistência) de um facto, ela pode ser expressa ou tácita/implícita, podendo deduzir-se um facto complementar ou concretizador não expressamente articulado de factos essenciais nucleares alegados que, com toda a probabilidade, o revelem.
  5. Sendo o contrato de arrendamento urbano oneroso e sinalagmático, a obrigação de realização de obras pelo locador tem de ser vista à luz do princípio da equivalência das atribuições patrimoniais e da justiça contratual (subprincípio da boa-fé objectiva).
  6. Por isso, tem de ponderar-se a relação entre o custo das obras necessárias e o valor da renda paga, sob pena de violação de elementares exigências de justiça e equidade contratual e, assim, de abuso do direito.
  7. Se, nessa ponderação, o custo das obras é tal que só ao fim de várias décadas será amortizado pelas rendas pagas, então deve considerar-se inexigível a realização de tais obras.
  8. Nesse caso, a culpa do locador pela omissão de obras de conservação apenas releva para efeitos indemnizatórios ao arrendatário, nos termos do disposto no art.º 798.º do CCiv..

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