Princípio do contraditório. Decisão surpresa. Contagem dos prazos. Segurança jurídica. Protecção da confiança

PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. DECISÃO SURPRESA. CONTAGEM DOS PRAZOS. SEGURANÇA JURÍDICA. PROTECÇÃO DA CONFIANÇA

APELAÇÃO Nº  741/21.9T8CNT-A.C1
Relator: VÍTOR AMARAL
Data do Acórdão: 28-09-2022
Tribunal: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE CANTANHEDE DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Legislação: ARTIGOS 3.º, N.º 3 E 5.º, N.º 3, AMBOS DO CPC, E ARTIGO 2.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Sumário:

I – – Suscitada pelos autores a questão da extemporaneidade da contestação, com determinados fundamentos, a que se seguiu resposta dos réus sobre a matéria, discutindo amplamente sobre o tema, concluindo os autores pela extemporaneidade do articulado e os réus pela sua tempestividade, assim ficando cumprido o princípio do contraditório, não tem o tribunal de voltar a ouvir as partes sobre tal matéria se decidir, no plano de direito, no sentido de estar verificada essa extemporaneidade com base num fundamento jurídico a que as partes não aludiram, consistente em o prazo dilatório, que antecede o prazo perentório para contestar, não se suspender em férias judiciais (por apenas o prazo perentório sofrer tal suspensão), inexistindo, em tal caso, decisão-surpresa.
II – Se os serviços do tribunal prestam informação ao citando, em formulário de que dispõem, acompanhando o expediente de citação (com dimensão explicativa/informativa), sobre prazo para defesa/contestação e respetivo modo de contagem, apresentando-o como um prazo aumentado pela dilação, que se suspende em férias judiciais, então não é exigível ao destinatário – comummente um leigo em matérias jurídicas, numa altura em que ainda não estava representado por advogado, com o inerente «mitigado grau de censura» – que proceda à distinção entre prazo dilatório e prazo perentório, para concluir que só este último (e não aquele) está sujeito a essa suspensão.
III – Cabendo aos tribunais, no exercício do poder/função judicial do Estado, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, estes esperam daqueles uma conduta pautada pela boa-fé e verdade, em clima de confiança, em que têm o direito de acreditar na sua relação com todos os poderes públicos, devendo ser protegidas as expetativas por eles legitimamente criadas em resultado de comportamentos dos poderes do Estado, aos quais se exige previsibilidade de atuação, de acordo com o princípio constitucional do Estado de Direito democrático, nas vertentes dos subprincípios da segurança jurídica e da proteção da confiança.
IV – Oferecido o articulado de contestação em prazo compatível com aquele quadro informativo veiculado no ato da citação, em que o citado acreditou, tem de considerar-se tempestiva a contestação, sob pena de violação daqueles princípios.

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