Prescrição. Fundo de garantia automóvel. Contagem dos prazos. Anulabilidade. Contrato de seguro. Falsidade. Identificação. Condutor habitual

PRESCRIÇÃO. FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL. CONTAGEM DOS PRAZOS. ANULABILIDADE. CONTRATO DE SEGURO. FALSIDADE. IDENTIFICAÇÃO. CONDUTOR HABITUAL
APELAÇÃO Nº
487/09.6TBOHP.C1
Relator: TELES PEREIRA
Data do Acordão: 10-02-2015
Tribunal: COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – SECÇÃO CÍVEL
Legislação: ARTºS 498º, Nº 2 DO C.CIVIL; 25º, Nº 1 DO DL Nº 522/85; 54º, Nº 6 DO DL Nº 291/2007, DE 21/08; 25º, Nº 1 DA LEI DO CONTRATO DE SEGURO (DECRETO-LEI Nº 72/2008, DE 16 DE ABRIL (LCS)).
Sumário:

  1. A questão da prescrição do exercício do direito de recuperação pelo Fundo de Garantia do que satisfez aos lesados no quadro da respectiva intervenção deve ser equacionado no quadro do nº 2 do artigo 498º do CC, sendo a partir dessa referenciação que a razão de ser do instituto da prescrição – a definição da situação latente pela inércia do titular do direito na concretização desta – actua verdadeiramente.
  2. Vale como argumento a este respeito – para quem considerasse a questão duvidosa face ao enquadramento propiciado pelo artigo 25º, nº 1 do DL 522/85 – a opção expressa assumida pelo legislador no Diploma sucessor deste, ou seja no artigo 54º, nº 6 do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto (regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel): “[a]os direitos do Fundo de Garantia Automóvel previstos nos números anteriores é aplicável o nº 2 do artigo 498º do Código Civil, sendo relevante para o efeito, em caso de pagamentos fraccionados por lesado ou mais do que um lesado, a data do último pagamento efectuado pelo Fundo de Garantia Automóvel”.
  3. Esta questão de sucessão de regimes legais é relevante – estando em causa um contrato celebrado na vigência do DL 522/85 e um acidente ocorrido nesse enquadramento, mas tratando-se de um efeito (a intervenção do Fundo de Garantia) já produzido no domínio do DL 291/2007 –, a sucessão de leis é relevante, dizíamos, no sentido em que o artigo 54º, nº 6 do lei nova (DL 291/2007) assumiu um pendor objectivamente interpretativo, projectando o seu sentido na lei interpretada (o artigo 25º, nº 1 do DL 522/85), como resulta do artigo 13º, nº 1 do CC: “[a] lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza”.
  4. No quadro legal emergente do Lei do Contrato de Seguro, aprovada pelo Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril (LCS), a afirmação do tomador do seguro no preenchimento da proposta de ser ele, como condutor encartado há mais de 20 anos, o condutor habitual da viatura objecto do seguro, escondendo da Seguradora que o verdadeiro condutor habitual (o filho do tomador) havia obtido licença de conduzir poucos meses antes da celebração do contrato, este comportamento gera a anulabilidade desse contrato de seguro por inexactidão dolosa quanto à declaração de risco, nos termos do artigo 25º, nº 1 da LCS.
  5. Essa incidência (a falsa declaração quanto ao condutor habitual) refere-se a um elemento muito significativo para a apreciação do risco assumido pela seguradora no contrato, com incidência na quantificação do prémio;
  6. A referida anulabilidade actua, nos termos do artigo 25º, nº 1 da LCS, mediante declaração da seguradora ao tomador do seguro, sendo que isso, descobrindo a seguradora a fraude apenas posteriormente à ocorrência do sinistro, actuará, no quadro de um processo judicial instaurado contra essa seguradora, por via de excepção (invocação pela seguradora na contestação da extinção do contrato por anulabilidade nesse contexto declarada);
  7. O disposto no artigo 22º do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto (Regime do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel) não impede a oponibilidade da referida anulabilidade do contrato pela seguradora aos lesados pelo acidente e, reflexamente, ao Fundo de Garantia Automóvel, quando esta entidade exerce a sub-rogação decorrente de ter assumido, perante esses lesados, a responsabilidade indemnizatória emergente do referido acidente.

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