Prescrição do título de crédito exequendo. Livrança em branco. Abuso

PRESCRIÇÃO DO TÍTULO DE CRÉDITO EXEQUENDO. LIVRANÇA EM BRANCO. ABUSO
APELAÇÃO Nº
5046/16.4T8CBR-A.C1
Relator: SÍLVIA PIRES
Data do Acordão: 11-06-2019
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – SOURE – JUÍZO EXECUÇÃO – JUIZ 1
Legislação: ARTºS 70º E 77º DA LULL; 15º DO RCCG.
Sumário:

  1. É comum que a subscrição de uma livrança em branco garanta a satisfação de um direito de crédito, facultando ao credor o acesso a uma ação executiva na hipótese de incumprimento da respetiva obrigação, sendo a livrança preenchida de acordo com o que tiver sido pactuado aquando da sua subscrição em branco pelo devedor, sob pena do preenchimento se revelar abusivo.
  2. A possibilidade conferida ao mutuante de preencher livremente a livrança, designadamente no que se refere às datas de emissão e vencimento, confere-lhe um poder de dilatar infinitamente no tempo a cobrança do crédito cambiário, revelando-se, essa possibilidade, desde logo, de uma forma ostensiva, desproporcionalmente desvantajosa para o mutuário, o qual fica, por um período de tempo ilimitado, sujeito a uma indesejável situação de incerteza, o que contraria os ditames da boa-fé objectiva nos contratos sujeitos ao regime das Cláusulas Contratuais Gerais constante do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (RCCG).
  3. Uma liberdade total na inserção das datas de emissão e de vencimento de uma livrança subscrita em branco permitiria ao credor defraudar os interesses públicos e do devedor que presidem ao instituto da prescrição dos créditos cambiários, proporcionando a criação de direitos de crédito imprescritíveis, sendo certo que o nosso ordenamento não permite uma renúncia antecipada à prescrição – art.º 302º, n.º 1, do C. Civil – e comina com a nulidade os negócios jurídicos destinados a modificar os prazos legais de prescrição – art.º 300º do C. Civil –, o que suscita até a hipótese de invalidade do previsto naquela cláusula, por força do art.º 280º do C. Civil.
  4. Destinando-se a livrança subscrita em branco a facilitar a cobrança do crédito em causa, na hipótese de se verificar o incumprimento da respectiva obrigação, resolvido o contrato, com fundamento nesse incumprimento, a boa-fé determina que a livrança seja coincidentemente preenchida com a resolução do contrato, iniciando-se, a partir desse momento, a contagem do prazo de prescrição previsto no art.º 70º da LULL. 

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