Ónus de alegação. Factos essenciais. Consentimento tácito. Deliberação. Cessão de quota. Procuração
ÓNUS DE ALEGAÇÃO. FACTOS ESSENCIAIS. CONSENTIMENTO TÁCITO. DELIBERAÇÃO. CESSÃO DE QUOTA. PROCURAÇÃO
APELAÇÃO Nº 1990/07.8TBAGD.C1
Relator: MARIA DOMINGAS SIMÕES
Data do Acordão: 27-01-2015
Tribunal: COMARCA DO BAIXO VOUGA – AVEIRO – JUÍZO DO COMÉRCIO
Legislação: ARTIGOS 5º Nº 2 DO NCPC E 230º Nº6 DO CSC
Sumário:
- Impondo o n.º 2 do art.º 5.º do NCPC ao juiz que tome em consideração “os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar”, tal significa que tais factos, podendo ser adquiridos para o processo até final do julgamento, terão de ser incluídos na fundamentação de facto na sentença.
- Estando ainda aqui em causa factos essenciais, ou seja, aqueles que constam da previsão normativa, reconduzindo-se aos factos constitutivos, impeditivos, extintivos ou modificativos, exige todavia a lei uma conexão “objectiva” entre o núcleo da matéria de facto alegada e os factos omitidos no articulado, que se devem configurar como complementares ou concretizadores dos alegados.
- É de considerar que se verifica a exigida identidade, ainda que parcial, se os RR invocam, embora com deficiente concretização, o reconhecimento de uma cessão não consentida com fundamento na prática, pela ré sociedade, de actos omissivos ao longo dos tempos, após ter tomado conhecimento da transmissão, e o juiz considerou a final outros factos, adquiridos para o processo na fase de julgamento, os quais, em seu entender, preenchiam o conceito de consentimento tácito a que se refere o n.º 6 do art.º 230.º do CSC, não padecendo a sentença proferida do vício do excesso de pronúncia.
- Sendo pressuposto de aplicação da solução consagrada no n.º 6 do art.º 230.º do CSC a ausência de deliberação, excluídos da sua previsão ficam os casos em que existiu uma deliberação expressa no sentido da ratificação da cessão efectuada, tendo a mesma sido judicialmente impugnada.
- Não pode atribuir-se o valor de consentimento tácito à ausência de impugnação das deliberações em que participaram os cessionários na pendência da acção de anulação da deliberação ratificativa da cessão, posto que esta, sendo anulável e deixando de produzir os seus efeitos caso seja anulada por sentença judicial -que tem assim efeitos constitutivos- produz até esse momento, ressalvados os casos de suspensão, os efeitos jurídicos a que tendia.
- A procuração no interesse exclusivo do mandatário não opera a transmissão da posição jurídica do “dominus”, que se mantém como seu titular, com os correspondentes poderes de disposição; é assim válida a cessão de quota em que interveio o seu titular, a despeito de ter outorgado em data anterior procuração irrevogável no interesse do mandatário, conferindo-lhe poderes para proceder à transmissão da mesma, sem prejuízo de poder incorrer em responsabilidade por violação do negócio celebrado com o procurador e que constitui a relação subjacente.