Burla para obtenção de serviços

BURLA PARA OBTENÇÃO DE SERVIÇOS. O ILÍCITO CONTRAVENCIONAL PREVISTO POR NÃO PAGAMENTO DE BILHETE DE COMBOIO
RECURSO PENAL Nº
1107/02 
Relator: DR. BARRETO DO CARMO 
Data do Acordão: 21-05-2003
Tribunal Recurso: ANSIÃO
Legislação Nacional: ART.º 220º DO CÓDIGO PENAL E ART.º S 39º E 43º DO DEC. LEI N.º 39789 DE 21 DE AGOSTO DE 1982 COM O ART.º 6.º DO DEC. LEI N.º 400/82 DE 23/9 E ART.º 7.º E 14.º DA PORTARIA N.º 1116/80 DE 31/12 E AINDA O DECRETO LEI 108/78 DE 24/05.
Sumário:

  1. Os art. s 39° e 43° Decreto-Lei no.39789, de 21 de Agosto de 1982 com o art. 6° do Decreto- Lei no.400182, de 2319 e art. s 7° e 14° da Portaria no.1116180, de 31112 e ainda o Decreto- Lei no.108178, de 24105 – configuram um ilícito contravencional, a partir da definição de passageiro sem bilhete, punido com um mínimo de 49,88 € (10000$00) até ao décuplo dessa quantia.
  2. Assim, o passageiro sem bilhete, aquele que é encontrado a viajar de comboio sem ter adquirido previamente bilhete e apresentado ao revisor quando lhe é solicitado tem de pagar o valor da viagem acrescido de uma sobretaxa de valor igual a metade desse preço, num mínimo de 49,88 €, podendo pagar num prazo de 8 dias, na estação onde foi identificado, se não dispor de quantia para o pagamento imediato e, caso não pague neste prazo fica obrigado ao pagamento do décuplo daquela quantia.
  3. A distinção entre a contravenção e o crime encontrar-se-á necessariamente no elemento subjectivo, no art. 220°, normatizado na expressão com intenção de não pagar e na contravenção encontrado no dever de cuidado de comprar o bilhete antes de entrar no comboio, de o conservar durante toda a viagem e de o apresentar sempre que lhe seja solicitado.
  4. O crime do art. 220° do Código Penal, constitui uma forma de burla; a burla, como conceito jurídico normativo, inclui sempre um comportamento fraudulento, enganoso artificioso (Luís Osório, Código Penal anotado, IV – 199 e ss.) que o direito romano encontrava na actividade do liçador (do verbo illitio- enganar com promessas, atrair com enganos).
  5. Não basta não pagar; continua a exigir-se o duplo nexo de imputação objectiva, se praticado por acção, na medida em que a actuação não permite ao destinatário crer que a sua intenção é não pagar.
  6. O momento em que o agente se recusa a pagar o preço do bilhete, depois de instado a pagar, (normatizado na expressão se negar a solver a dívida contraída) releva para a consumação do crime porquanto só então se verifica a lesão do património da vítima (e por isso, se vê como uma condição objectiva de punibilidade, como acima se indicou).
  7. Na contravenção o elemento subjectivo consubstancia-se na violação do dever de cuidado; pouco importa porque razão o indivíduo não apresenta o bilhete ao revisor, se porque não o comprou, se porque não tem dinheiro, se perdeu a carteira, se perdeu o próprio bilhete que antes comprou. O agente tem o dever de cuidar de comprar o bilhete antes de entrar para o comboio, de o conservar durante toda a viagem e de o exibir ao revisor sempre que lhe for solicitado; a contravenção consuma-se no momento em que sendo pedido o bilhete o agente não o exibe, mesmo que o tenha comprado e o perdeu, mesmo que nunca tivesse a intenção de viajar sem pagar.

Consultar texto integral