Crime de desobediência. Livre convicção do julgador
CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. LIVRE CONVICÇÃO DO JULGADOR. DEPOIMENTO INDIRECTO. PROVA INDICIÁRIA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO
RECURSO PENAL Nº 35/09.8GTCBR.C1
Relator: DR. ORLANDO GONÇALVES
Data do Acordão: 09-12-2009
Tribunal: COIMBRA
Legislação: ARTIGOS 32º DA CRP; 348º, Nº1 DO CP; 152º, Nº3 DO CE; 127º, 355 E 410º º DO CPP
Sumário:
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A convicção do Tribunal a quo é formada da conjugação dialéctica de dados objectivos fornecidos por documentos e outras provas constituídas, com as declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas, das lacunas, contradições, inflexões de voz, serenidade e outra linguagem do comportamento, que ali transparecem.
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O preceituado no art.127.º do Código de Processo Penal deve, assim, ter-se por cumprido quando a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objecto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, e onde não se vislumbre qualquer assumo de arbítrio na apreciação da prova.
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A prova indirecta “ … reside fundamentalmente na inferência do facto conhecido – indício ou facto indiciante – para o facto desconhecido a provar, ou tema último da prova” – cfr. Prof. Cavaleiro de Ferreira, “ Curso de Processo Penal”, Vol. II , pág. 289.
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De acordo com o disposto no art.128.º, n.º1, do C.P.P., a testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova. A testemunha tem conhecimento directo dos factos quando se apercebe deles imediatamente , por si, através dos seus sentidos.
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No depoimento indirecto aquilo de que a testemunha se apercebeu foi de outros meios de prova, mas não imediatamente dos próprios factos.
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Em regra , o interesse do depoimento indirecto é o de permitir que seja ouvida a pessoa que teve conhecimento directo do facto. Se essa pessoa não for ouvida o depoimento dela não pode, nesssa parte, servir como meio de prova, por a sua utilização e valoração ser incompatível com os princípios da imediação e contraditório , próprios da estrutura acusatória do nosso processo ( artigos 348.º, n.º 4 e 355.º, n.º1 do Código de Processo Penal).
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Tendo as testemunhas F… e Z, militares da GNR, se limitado a narrar os factos que viram e ouviram no local do acidente de viação no âmbito de averiguação da ocorrência de que tomaram conta, nada obstava a que o Tribunal a quo pudesse valorar, como valorou, os seus depoimentos.
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Da fundamentação da matéria de facto da sentença recorrida resulta claro que as testemunhas F… e Z, militares da GNR, não declararam ao Tribunal a quo, em momento algum, que concluíram que o arguido fora o condutor do veículo automóvel, nas circunstâncias de tempo e lugar em causa, porque o ouviram dizer ao próprio arguido.
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O Tribunal de recurso apenas pode censurar o uso feito do principio do in dbio pro reo se da decisão recorrida resultar que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que , face a ele , escolheu a tese desfavorável ao arguido.
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Da fundamentação da matéria de facto da douta sentença não se vislumbra que o Tribunal recorrido tenha chegado a qualquer estado de dúvida sobre a prática pelo arguido N… dos factos dados como provados. Pelo contrário, o tribunal a quo explicitou na fundamentação da matéria de facto que “ Face a toda esta prova, não tivemos dúvidas, que o arguido conduzia o veículo em causa e se recusou a efectuar o teste de pesquisa do álcool no sangue.”