Constituição de assistente. Legitimidade. Crimes fiscais

CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE. LEGITIMIDADE. CRIMES FISCAIS
RECURSO PENAL Nº
1208/08.6TDLSB.C1
Relator: MOURAZ LOPES
Data do Acordão: 28-01-2010
Tribunal: ALCANENA 
Legislação: ARTIGOS 103.º N.º1 DO RGIT E 68º,Nº1 DO CPP
Sumário:

  1. O assistente assume no processo penal português uma relevância jurídica estruturalmente relevante, na perspectiva dogmática e também em temos de política criminal, na medida em que estamos na presença de um colaborador do Ministério Público, com direitos e deveres próprios, mas a cuja actividade se subordina na intervenção processual que aquele, como titular da acção penal, executa.
  2. A figura do assistente, embora sustentada de alguma forma no conceito de ofendido, não pode ser com este confundido. Daí que para além das pessoas a quem a leis especiais conferirem esse direito, podem constituir-se assistentes no processo penal, os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos .
  3. O conceito de ofendido, para efeitos de legitimidade para constituição como assistente, coincide com o conceito consagrado no CP para aferir da legitimidade para apresentar queixa.
  4. Tem-se verificado um alargamento jurisprudencial do entendimento da legitimidade para a constituição de assistente, para além da natureza individual ou supra-individual do bem jurídico tutelado pela incriminação dos vários tipos de crime, reconhecendo-se que, em determinados tipos de crime público que protegem bens eminentemente públicos (v.g., desobediência, denúncia caluniosa, falso testemunho, abuso de poder, falsificação de documentos), o legislador pretendeu também tutelar bens jurídicos de natureza particular.
  5. No caso em apreciação, como resulta do despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público e também é referido pelo despacho sub judice, a factualidade dos autos é susceptível de, em termos meramente abstractos, reconduzir-se à previsão do artigo 103°, n°1, alinea a), do Regime Geral da Infracções Tributárias (aprovado pela Lei n°15/2001, de 05 de Junho), que respeita ao crime de fraude fiscal.
  6. O crime de fraude fiscal é um crime de perigo que é dirigido a uma diminuição das receitas fiscais ou à obtenção de um benefício fiscal injustificado. O bem jurídico especialmente protegido com tal crime é a ofensa ao património ou erário público. São os interesses do Estado, na sua vertente vulgarmente denominada por Fisco ou Fazenda Nacional, entendido como sistema dinâmico de obtenção de receitas e realização de despesas. Nestes crimes não são visíveis quaisquer bens jurídicos de natureza particular.
  7. Não assiste, assim, razão aos recorrentes quando pretendem intervir nos autos como assistentes, por virtude de os interesses protegidos pela infracção em apreciação no inquérito assumirem uma dimensão pública cujo interesse jurídico-penal não foi pelo legislador excepcionado em termos de ser admitida a intervenção de outros que não o próprio Estado.

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