Abuso de confiança fiscal. Constitucionalidade

ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL. PRINCIPIO DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA. LIQUIDAÇÃO DO IVA. PRESCRIÇÃO. IMPUGNAÇÃO (AMPLA) DA MATÉRIA DE FACTO. APROPRIAÇÃO. ADMINISTRADORES DE FACTO. CONSTITUCIONALIDADE
RECURSO PENAL Nº 97/04.4IDCBR.C1
Relator: DR. JORGE GONÇALVES
Data do Acordão: 25-03-2009
Tribunal: CONDEIXA-A-NOVA
Legislação: ARTIGOS 6.º, 7.º, 24.º, N.º1, 2 E 5, DO DECRETO-LEI N.º 20-A/90, NA REDACÇÃO QUE LHE FOI DADA PELO DECRETO-LEI N.º 394/93, DE 24 DE NOVEMBRO; ARTIGO 105.º, N.º1 E 5, DA LEI N.º 15/2001, DE 5 DE JUNHO, 26.º E 30.º, N.º2, DO CÓDIGO PENAL; 412.º, N.ºS 3 E 4 DO C.P.P.; 18.º, 27, N.º2 E 3 E 29.º DA C.R.P.
Sumário:

  1. Com a dedução da acusação fica definido e fixado o objecto do processo, exigindo-se, a parir desse momento, uma necessária correlação entre a acusação e a decisão. Essa correlação traduz-se na exigência de que, definido o objecto do processo, o tribunal não possa, como regra, atender a factos que não foram objecto da acusação, estando, por conseguinte, limitada a sua actividade cognitiva e decisória, o que constitui a chamada vinculação temática do tribunal.
  2. Depois de fixado na acusação, o objecto do processo deve manter-se o mesmo até ao trânsito em julgado da sentença – é o chamado princípio da identidade.
  3. Ao juiz de julgamento, incumbe o papel de direcção da fase de julgamento balizado e limitado pelo conteúdo da acusação ou da pronúncia, pelo thema decidendum (objecto do processo) e pelo thema probandum (extensão da cognição).
  4. No caso de abuso de confiança fiscal por não entrega do IVA, a verificação do crime não depende de qualquer liquidação pela administração tributária, pelo que o prazo de prescrição do procedimento criminal, é não o de 4 anos, previsto no n.º 3 do artigo 21.º do RGIT, mas antes o prazo previsto no n.º 1 da mesma norma, que sofre as interrupções e suspensões previstas na lei penal.
  5. O recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não constituiu um novo julgamento do objecto do processo, mas antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgicamente, erros in judicando ou in procedendo, que o recorrente deverá expressamente indicar, impõe-se a este o ónus de proceder a uma tríplice especificação, estabelecendo o artigo 412.º, n.º3, do C.P.Penal:
  6. A «apropriação» é uma consequência lógica do desvio do destino das prestações tributárias retidas, pelo que, assim entendida, como omissão de entrega dessas prestações a quem de direito, com sua utilização para outros fins. Não se trata apenas da não entrega das prestações tributárias, mas da sua utilização para outros fins, com consciência de que as mesmas eram pertença do Estado.
  7. O legislador, avisado como é e conhecedor de que nesta área as cifras negras são grandes [Cfr. Preambulo do Código Penal e Lopes Rocha, A responsabilidade das Pessoas Colectivas, CEJ 1085, pág. 110], no desenho do ilícito típico das condutas voluntárias dos titulares de órgãos de pessoas colectivas, desconsiderou a circunstância da sua regular ou irregular constituição, ou mera associação de facto, quer a circunstância de os agentes serem titulares de direito ou meramente de facto
  8. Não é inconstitucional o artigo 105.º do RGIT, designadamente no sentido de que tal artigo acolhe, como elemento implícito, a exigência de apropriação.

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