Burla. Erro. Falsificação
CRIME DE BURLA. CRIME DE EXECUÇÃO VINCULADA. ERRO OU ENGANO. CRIME DE FALSIFICAÇÃO
RECURSO PENAL Nº 901/03.4PAMGR.C1
Relator: DR. BARRETO DO CARMO
Data do Acordão: 10-09-2008
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA MARINHA GRANDE – 1.º JUÍZO
Legislação Nacional: ARTIGOS 217.º E 256.º, N.º 1, AMBOS DO CÓDIGO PENAL
Sumário:
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O crime de burla configura-se como um crime de execução vinculada – a lesão do bem jurídico tem que ocorrer como consequência dos comportamentos típicos definidos pelo legislador – e que se traduz na utilização de um meio enganoso tendente a induzir a pessoa em erro, que, por seu turno, a leva a praticar actos de que resultam prejuízos patrimoniais próprios ou alheios, de molde a que o engano seja causa da situação de erro em que se encontra a vítima.
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Para que ocorra o elemento típico indutor da criação de um estado intelectivo erróneo na pessoa da vitima é necessário que o erro ou engano tenham sido provocados astuciosamente, isto é, que a conduta do agente comporte a manipulação de outra pessoa, caracterizando-se por uma sagacidade que envolve a escolha dos meios idóneos para conseguir criar e obter uma representação distorcida e desfocada da realidade em que a relação estabelecida se deveria ter desenvolvido.
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A adequação de meios idóneos em que radica a astúcia importa uma adequação do comportamento do agente à criação desse erróneo estado de representação deformada da realidade e depende das especificas particularidades do caso concreto – a situação concreta tanto pode exigir a utilização de meios muitos sofisticados, como o menos sofisticado dos procedimentos – sendo que, a idoneidade do meio enganador utilizado pelo agente, se afere tomando em consideração as características do concreto burlado.
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Constituindo-se o direito penal a ultima ratio da intervenção do Direito nas relações jurídicas e podendo afirmar-se que no mundo especifico dos negócios poderá sempre ocorrer uma margem de astúcia – estabelecendo-se como limites as regras próprias da boa fé, da responsabilidade de informação da outra parte e de critérios de lealdade no comércio jurídico – só um erro jurídico-penalmente relevante integrará o âmbito de protecção do art. 217º.
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Sendo o crime de burla um crime que ocorre com uma maior ou menor participação da vitima é necessário que se verifique um duplo nexo causal: o engano deve ser a causa da situação de erro em que se encontra a vítima e, por sua vez, esse estado de erro é a causa da prática pelo burlado dos actos de que decorrem prejuízos patrimoniais.
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A aferição da existência de um prejuízo patrimonial na esfera do lesado estabelece-se pela verificação de um empobrecimento ou depreciação do conjunto de bens materiais disponíveis a que não tem que ocorrer um correspondente enriquecimento por parte do agente (embora se exija que o agente actue com a intenção de enriquecimento ilegítimo, para si ou para outrem). VII. – Para a consumação do crime de não se exige a concretização do enriquecimento (material)do agente ocorrendo logo que ocorra o prejuízo patrimonial da vítima (crime de resultado parcial ou cortado).