Matéria de facto. Apreciação da prova. Presunção. Registo predial. Posse. Usucapião
MATÉRIA DE FACTO. APRECIAÇÃO DA PROVA. PRESUNÇÃO. REGISTO PREDIAL. POSSE. USUCAPIÃO
APELAÇÃO Nº 194/09.0TBPBL.C1
Relator: JOSÉ AVELINO GONÇALVES
Data do Acordão: 03-12-2013
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DE POMBAL – 2º JUÍZO
Legislação: ARTºS 712º, Nº 1 DO CPC; 7º DO C. R. PREDIAL; 350º, Nº 1, E 1268º, Nº 1, DO CÓDIGO CIVIL.
Sumário:
- O julgamento da matéria de facto é o resultado da ponderação de toda a prova produzida. Cada elemento de prova deve ser ponderado por si, mas também em relação/articulação com os demais.
- Assim, deverá ponderar-se o depoimento de cada testemunha, conjugado com os das outras testemunhas, todos conjugados com os demais elementos de prova.
- Mais, quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas – nomeadamente prova testemunhal -, a respectiva sindicação tem de ser exercida com o máximo cuidado e só deve o tribunal de 2.ª instância alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando efectivamente se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança muito elevada, que houve errada decisão na 1.ª instância, por ser ilógica a resposta dada em face dos depoimentos prestados ou por ser formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela.
- As presunções registrais emergentes do art.º 7º do Código do Registo Predial não abrangem factores descritivos, como as áreas, limites, confrontações, do seu âmbito exorbitando tudo o que se relacione com os elementos identificadores do prédio. Apenas faz presumir que o direito existe e pertence às pessoas em cujo nome se encontra inscrito, emerge do facto inscrito e que a sua inscrição tem determinada substância – objecto e conteúdo de direitos ou ónus e encargos nele definidos (art.º 80º n.º 1 e 2 do Código do Registo Predial).
- A presunção não abrange os limites ou confrontações, a área dos prédios, as inscrições matriciais – com finalidade essencialmente fiscal – numa palavra, a identificação física, económica e fiscal dos imóveis, tanto mais que o mesmo é susceptível de assentar em meras declarações dos interessados, escapando ao controle do conservador, apesar da sua intervenção mesmo oficiosa.
- O possuidor goza da titularidade do direito, excepto se existir, a favor de outrem, presunção fundada no registo anterior ao início da posse – artigo 1268º, nº 1, do Código Civil.
- A regra é, pois, a de que a posse implica a presunção legal da titularidade do direito, e a excepção no caso de colisão entre ela e a presunção derivada do registo de um direito anterior ao início da posse, caso em que prevalece esta última presunção.
- Por isso, nos termos da norma do artigo 350.º n.º 1 do Código Civil, compete àqueles que se arrogam proprietários, provar que o detentor não é possuidor. Podendo, assim, adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa – é atribuída a propriedade ao possuidor, não propriamente porque o possuidor conseguiu provar que era proprietário, mas antes porque não foi provado que ele não o era.
- A usucapião, como forma de aquisição originária, não só se abstrai, como inclusivamente se sobrepõe a certas vicissitudes ou irregularidades formais ou substanciais relativamente a actos de alienação ou oneração de bens ou até mesmo à prática de actos que originariamente pudessem considerar-se ilegais ou até mesmo violadores dos direitos de outrem
- O criador de tal instituto entendeu que, ponderados determinados aspectos, certas situações de facto, pudessem converter-se num verdadeiro direito, como ocorre no caso da posse, desde que se prolongue durante um período de tempo significativo, o qual se sobrepõe inclusivamente aos próprios vícios que hajam inquinado a posição do possuidor face ao bem possuído, pois surge um direito ex – novo, por mera vontade do respectivo titular, na sua esfera jurídica, desde que judicialmente verificada e declarada a situação de facto que lhe subjaz e que, inclusivamente retrotrai à data do início de tal situação de facto.