Leitura do auto de notícia. Aditamento. Audiência de julgamento. Determinação da medida das penas. Pena unitária. Concurso de crimes. Pena acessória. Responsabilidade civil decorrente da prática de crime. Processo penal. Princípio da suficiência

LEITURA DO AUTO DE NOTÍCIA. ADITAMENTO. AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO. DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DAS PENAS. PENA UNITÁRIA. CONCURSO DE CRIMES. PENA ACESSÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DA PRÁTICA DE CRIME. PROCESSO PENAL. PRINCÍPIO DA SUFICIÊNCIA
RECURSO CRIMINAL Nº
186/14.7GCLSA.C1
Relator: VASQUES OSÓRIO
Data do Acordão: 09-01-2017
Tribunal: COIMBRA (INSTÂNCIA LOCAL DA LOUSÖ J1)
Legislação: ARTS. 7.º, 82.º, 140.º, 356.º, 357.º E 379.º DO CPP; ARTS. 40.º, 69.º, 70.º, 71.º, 77.º E 129.º DO CP.
Sumário:

  1. Embora do aditamento [a auto de notícia] conste o relato da testemunha de uma conversa que teve com o recorrente, não integra o conceito de declarações de arguido, no sentido em que estas, enquanto meio de prova, se encontram reguladas nos arts. 140º e ss. do mesmo código.
  2. A actividade investigatória de recolha informal de indícios tem cobertura legal, não estando as declarações que constam do aditamento como tendo sido prestadas pelo recorrente, sujeitas às restrições estabelecidas nos arts. 356.º, n.º 1, e 357º, n.º 1, ambos do CPP, pelo que, a sua leitura em audiência de julgamento não determinou a verificação de nulidade.
  3. A moldura penal abstracta de cada crime é fixada pelo legislador, tendo em conta todas as formas e graus de cometimento do facto típico, fazendo corresponder aos de menor gravidade o limite mínimo da pena e aos de maior gravidade o limite máximo da pena.
  4. A medida concreta da pena irá resultar da medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos requerida por cada caso – tutela das expectativas da comunidade na manutenção e reforço da norma violada [prevenção geral positiva ou de integração] –, temperada, quando possível, pela necessidade de reintegração social do agente [prevenção especial positiva de socialização], sempre, com respeito pelo limite inultrapassável da medida da culpa.
  5. As circunstâncias atenuantes e previstas no n.º 2 do art. 71.º do CP terão que ser, naturalmente, objectivadas em factos e estes, para poderem, neste circunspecto, ser relevados, terão que constar dos factos provados.
  6. Os crimes em concurso são apenas os que integram o objecto dos autos, os quais têm a particularidade de resultarem de uma mesma acção negligente pelo que, o circunstancialismo a ponderar será precisamente o mesmo que foi ponderado na determinação da medida das penas parcelares, acrescendo agora, apenas, a personalidade do agente.
  7. As penas acessórias têm a natureza de penas criminais. Por tal razão, não prevendo o CP regras específicas para a determinação da sua medida, são-lhes aplicáveis os critérios gerais de determinação da medida das penas, previstos naquele código.
  8. Assim, tendo o recorrente praticado dois crimes de homicídio por negligência, a sua responsabilização penal impunha a determinação de duas concretas penas principais e, depois, a fixação de uma pena principal única, o que foi feito, e impunha também a determinação de duas concretas penas acessórias e, depois, a fixação de uma pena acessória única, o que não foi feito.
  9. Ao não determinar a pena acessória a aplicar a cada crime de homicídio negligente, o tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre questão que devia ter apreciado, pelo que, nos termos do disposto no art. 379.º, n.º 1, c) do CPP, padece a sentença de nulidade por omissão de pronúncia.
  10. A prática de um crime pode dar origem, para além de responsabilidade penal, a responsabilidade civil e, portanto, a uma indemnização de perdas e danos de natureza exclusivamente civil.
  11. Para o ressarcimento de danos pelo lesado, o CPP consagra o sistema de adesão obrigatória, no seu art. 71º; contudo, o princípio admite excepções.
  12. O princípio da suficiência, estabelecendo o n.º 1 do art. 7.º do CPP, que comporta excepções conforme previsto no n.º 2, significa que o tribunal criminal assume competência própria para se pronunciar sobre todas as questões, independentemente da sua natureza, penal ou outra, que interessem à decisão da causa.
  13. Se o tribunal a quo, para decidir quem era responsável pelo pagamento da indemnização peticionada, tinha que, previamente, fixar a legitimidade passiva dos demandados, se para tanto, tinha que decidir se existia ou não contrato de seguro válido e eficaz na data do acidente, o que dependia da simulação ou não da venda do veículo, temos por certo que, ao conhecer de todas estes aspectos, se limitou a emitir pronúncia sobre questões que devia apreciar, pelo que não enferma a sentença, nesta parte, de excesso de pronúncia e, portanto, da nulidade prevista na 2.ª parte da alínea c) do n.º 1 do art. 379.º do CPP.

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