Insolvência. Promessa de prestação. Legislação comunitária. Insolvência parcial. Competência internacional. Alteração. Residência. Princípio da livre circulação. Violação. Contraditório
INSOLVÊNCIA. PROMESSA DE PRESTAÇÃO. LEGISLAÇÃO COMUNITÁRIA. INSOLVÊNCIA PARCIAL. COMPETÊNCIA INTERNACIONAL. ALTERAÇÃO. RESIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA LIVRE CIRCULAÇÃO. VIOLAÇÃO. CONTRADITÓRIO
APELAÇÃO Nº 1523/12.4TBACB-E.C1
Relator: MOREIRA DO CARMO
Data do Acordão: 21-10-2014
Tribunal: ALCOBAÇA – 3º J
Legislação: ARTS. 36, 83, 238, 294 CIRE, REGULAMENTO (CE Nº 1346/2000 CONSELHO DE 29/5, ART. 3 CPC
Sumário:
- O processo particular de insolvência, previsto nos arts. 294º a 296º do CIRE, insere-se no Capítulo III, do Título XV, que tal como o Título XIV (que se inicia no art. 271º do mesmo diploma) respeita à execução do Regulamento (CE) nº 1346/2000, do Conselho, de 29.5.
- Nesse artigo 271º regula-se a competência internacional do tribunal português para o processo de insolvência principal caso o devedor tenha bens situados fora do nosso país mas dentro de outro estado da União Europeia, tendo em conta o disposto no art. 3º, nº 1, de tal Regulamento. Assim, de acordo com o texto deste normativo, se o centro dos interesses principais do devedor se encontrar localizado em Portugal, o tribunal nacional é competente para abrir e prosseguir esse processo de insolvência principal. Já no caso de o centro dos interesses do devedor se situar fora do nosso território mas dentro de outro Estado membro da U. Europeia então, de acordo com tal art. 3º, seu nº 2, do mesmo Regulamento, o tribunal português é competente para abrir e prosseguir um processo de insolvência relativo ao referido devedor se este possuir um estabelecimento em solo pátrio, sendo, porém, os efeitos deste processo limitados aos bens que se encontrem em Portugal.
- Este processo denomina-o o Regulamento de processo territorial, como resulta do citado art. 3º, seu nº 4, enquanto a nossa legislação nacional o denomina de processo particular, no referido Capítulo III do CIRE (art. 294º a 296º).
- Por sua vez, quando for aberto um processo de insolvência principal noutro Estado membro, ao abrigo do disposto no referido art. 3º, nº 1, qualquer processo de insolvência aberto posteriormente em Portugal, ao abrigo do nº 2, um processo territorial (ou particular), constitui um processo secundário, como resulta do mencionado art. 3º, nº 3, do Regulamento e da legislação portuguesa (arts. 272º, nº 1, e 296º, nº 1, do CIRE);.
- Finalmente, dispõe o mesmo Regulamento no seu art. 3º, nº 4, que nenhum processo de insolvência territorial/particular pode ser aberto antes da abertura de um processo principal de insolvência, salvo nas duas situações particularizadas nas suas a) e b).
- Não é possível convolar um processo de insolvência normal, iniciado por insolventes que se apresentaram à falência e na altura residentes em Portugal, sem bens localizados no estrangeiro, para processo particular de insolvência, previsto no art. 294º do CIRE, depois de declarada a falência e no âmbito do processado de exoneração do passivo, se entretanto, entre a apresentação à insolvência e a sentença que a declarou, ambos emigraram para a Alemanha e aí passaram a residir e trabalhar, tanto mais que não têm qualquer estabelecimento em Portugal.
- A violação pelo tribunal a quo do princípio do contraditório, previsto no art. 3º, nº 3, do NCPC, gera uma nulidade processual, a arguir, em devido tempo, perante esse tribunal, e não a arguir em recurso, perante o tribunal ad quem.
- Só é possível defender que o tribunal tem de autorizar previamente a mudança de residência dos insolventes, ao abrigo do art. 36º, c), do CIRE e de um dever de colaboração dos mesmos, para efeitos de apreciação liminar de exoneração do passivo, à sombra do art. 238º, nº 1, g), do mesmo código, depois da sentença ter declarado a insolvência e de ter fixado a residência aos mesmos, não antes, quando estes se apresentaram à insolvência e mudaram a residência entretanto, mas antes de tal sentença de insolvência.
- É inconstitucional a referida interpretação do art. 36º, c), do CIRE e do mencionado dever de colaboração, que exige a prévia autorização do tribunal aos insolventes para mudarem de residência, depois desta ter sido fixada na sentença que declarou a insolvência, designadamente em caso de os mesmos emigrarem para a Alemanha, por violação do art. 44º da C. Rep. Portuguesa.
- Não há violação do dever de informação dos devedores insolventes, nos termos do art. 83º, nº 1, a), do CIRE, para os efeitos de indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo, a coberto do art. 238º, nº, 1, g), do mesmo código, se os autos não mostram que foi solicitada informação aos mesmos, pelas entidades referidas naquele preceito, no decurso do processo de insolvência, e à qual os insolventes não tenham respondido.