Insolvência. Plano de insolvência. Aprovação. Homologação. Violação não negligenciável. Princípio par conditio creditorum

INSOLVÊNCIA. PLANO DE INSOLVÊNCIA. APROVAÇÃO. HOMOLOGAÇÃO. VIOLAÇÃO NÃO NEGLIGENCIÁVEL. PRINCÍPIO PAR CONDITIO CREDITORUM
APELAÇÃO Nº
1006/15.0T8LRA-D.C1
Relator: ANTÓNIO CARVALHO MARTINS
Data do Acordão: 09-05-2017
Tribunal: Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Leiria – Juízo Comércio – Juiz 1
Legislação: ARTS.72, 74, 207, 209, 212, 214, 215, 216 CIRE
Sumário:

  1. Não é suficiente para fundamentar o pedido de recusa da homologação do plano de insolvência o voto em contrário na deliberação de aprovação.
  2. O voto em contrário na deliberação de aprovação e a oposição à aprovação do plano de insolvência consubstanciam, duas realidades distintas, impondo o pedido de recusa de homologação do plano a alegação (atempada) e a demonstração “em termos plausíveis” de um qualquer dos fundamentos consagrados nas alíneas a) e b) do art. 216º do CIRE.
  3. Uma vez aprovado pelos credores, o plano de insolvência é sujeito a um segundo controlo jurisdicional [o “primeiro” ou “inicial” controlo jurisdicional é o a que alude o art. 207º do mesmo CIRE ), necessitando de ser homologado por sentença judicial, para que seja plenamente eficaz (cfr. arts. 214º a 216º do CIRE)
  4. A formulação da al. a) do nº1 do art. 216º CIRE. implica que se proceda a um exercício intelectual de prognose, por vezes complexo, que se traduz em comparar o que se antevê resultar da homologação do plano, para o reclamante, com aquilo que aconteceria na ausência dele.
  5. Só releva a violação que seja susceptível de influir no exame e na decisão da causa, que comprometa, irremediavelmente, o fim que a lei se propunha atingir; quando a ofensa da lei não tenha este efeito patológico, a violação é negligenciável ou desprezável, e o juiz fica autorizado a declarar irrelevante a nulidade correspondente.
  6. Nos termos do artº 215º do CIRE, o juiz pode recusar, oficiosamente, a homologação do plano aprovado na assembleia de credores, no caso em que ocorrer violação não negligenciável de regras procedimentais, ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza.
  7. Entende-se por regras procedimentais as que visam regular a forma como deverá desenrolar-se o processo, enquanto as segundas se reportarão ao dispositivo do plano de revitalização, bem como aos princípios que lhe devam estar subjacentes.
  8. A lei não define o que são vícios não negligenciáveis, e tem-se entendido que revestem tal natureza todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza, diversamente se verificando quanto às infracções que afectem, tão só as regras de tutela particular, que podem ser afastadas com o consentimento do protegido, sem deixar de atender, por razoável, o critério geral utilizado pela própria lei processual no art.º 195, do CPC.
  9. Em função do disposto no nº 1 do artº 216º do CIRE, a homologação deve ser recusada também quando, a pedido de algum credor, se demonstre em ternos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência dele ou que o plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar.
  10. Dentro da mesma categoria há motivos para destrinçar, conforme o grau hierárquico que couber aos vários créditos e que a ponderação das circunstâncias de cada situação pode justificar outros alinhamentos, nomeadamente tendo em conta as fontes do crédito. O plano deve, pois, tratar de forma igual o que é igual e desigualmente o que é desigual. O princípio da igualdade dos credores supõe, assim, uma comparação de situações, a realizar a partir de determinado ponto de vista. O Tribunal deve limitar-se a analisar se a regulação desigual da situação dos credores é manifestamente desadequada, por inexistência de fundamento razoável e relevante.
  11. O princípio da igualdade dos credores “par conditio creditorum” não confere, aos que deles beneficiam, um direito absoluto. Esse direito de crédito pode sofrer afrouxamento ou restrição como decorre do texto constitucional que contempla, a par do princípio da igualdade, o princípio da proporcionalidade e da proibição do arbítrio coenvolvidos na legalidade do exercício de direitos e deveres.

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