Insolvência. Graduação de créditos. Privilégio imobiliário especial. Bem imóvel. Empresa. Constitucionalidade. Lei. Código do trabalho

INSOLVÊNCIA. GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS. PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL. BEM IMÓVEL. EMPRESA. CONSTITUCIONALIDADE. LEI. CÓDIGO DO TRABALHO
APELAÇÃO  Nº
406/14.8TBCVL-A.C1
Relator: ISABEL SILVA
Data do Acordão: 08-07-2015
Tribunal: COMARCA DE CASTELO BRANCO – FUNDÃO – SEC. COMÉRCIO
Legislação: ARTºS 333º, Nº 1, AL. B) DO CÓDIGO DO TRABALHO; 128º DO CIRE.
Sumário:

  1. Se o objeto social da Insolvente consistia no comércio de artigos de vestuário, exercendo tal atividade através duma cadeia de lojas de venda ao público, todas elas arrendadas; se a Insolvente era proprietária de 2 imóveis – um, onde tinha instalados os serviços administrativos e contabilísticos, bem como o armazém a partir do qual tais lojas eram abastecidas, e outro, um talhão de terreno destinado a construção urbana, mas utilizado para parqueamento das viaturas com que procedia à distribuição dos artigos de vestuário pelos diversos pontos de venda -, deve entender-se que tais imóveis estão afectos e integram, de forma estável, a organização empresarial da empresa e, nessa medida, os créditos laborais das trabalhadoras balconistas das lojas têm privilégio imobiliário geral sobre tais prédios.
  2. Pelo que, uma vez que os factos demonstram uma conexão funcional entre as funções da trabalhadora T… (vendedora numa das lojas arrendadas) e ambos os imóveis da Insolvente, que eram necessários à forma como tinha organizada a sua empresa e desenvolvia a sua atividade, deve reconhecer-se-lhe o privilégio imobiliário especial sobre ambos esses prédios pertença da Insolvente, independentemente de não prestar serviço no espaço físico desses imóveis.
  3. A interpretação de que o privilégio imobiliário especial referido no art. 333º, nº 1, al. b) do CT concedido aos trabalhadores prefere à hipoteca, não padece de inconstitucionalidade, por violação do princípio da confiança, corolário do princípio do estado de direito (art. 2º), nem o princípio da proporcionalidade ínsito no art. 18º nº 2 da CRP.
  4. Atenta a configuração legal do apenso da “verificação de créditos” regulada no art. 128º e seguintes do CIRE, os princípios do pedido/dispositivo e o da preclusão, no que toca a questões de direito, devem ser perspetivados em função da reclamação de créditos e não das impugnações (art. 130º do CIRE).
  5. Isto porque é perante a reclamação de créditos que o credor manifesta a sua vontade de accionar o seu crédito, definindo-lhe os contornos: art. 128º, nº 1, e respetivas alíneas, do CIRE.
  6. Depois, a pretensão dos credores é sujeita a um primeiro “juízo”, por parte do administrador da insolvência, expresso na lista a que alude o art. 129º, nº 1 do CIRE.
  7. Mas, sob pena de violação do «princípio constitucional da reserva de função jurisdicional» e do «princípio constitucional da legalidade do conteúdo da decisão», ainda que na ausência de impugnações, esse “juízo” do administrador da insolvência pode e deve ser objeto de escrutínio por parte do Tribunal em tudo o que contender com questões de direito.
  8. A preclusão decorrente da ausência de impugnação do juízo” formulado pelo administrador da insolvência (art. 130º, nº 1 do CPC) deve entender-se reportada apenas às questões de facto pois, como decorre do art. 5º, nº 3 do CPC, o tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
  9. O privilégio imobiliário especial referido no art. 333º, nº 1, al. b) do CT decorre diretamente da lei, pelo que pode e deve ser atendido pelo Tribunal, uma vez verificados os factos pertinentes, ainda que o administrador da insolvência o não tenha reconhecido e o trabalhador não tenha impugnado essa decisão do administrador.

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