Inimputabilidade. Prova pericial. Princípio da livre apreciação. Perigosidade. Internamento de inimputável. Suspensão da execução da medida de internamento
INIMPUTABILIDADE. PROVA PERICIAL. PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO. PERIGOSIDADE. INTERNAMENTO DE INIMPUTÁVEL. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAMENTO
RECURSO CRIMINAL Nº 444/21.4PBCTB.C1
Relator: HELENA BOLIEIRO
Data do Acórdão: 22-02-2023
Tribunal: JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE CASTELO BRANCO – JUIZ 1
Legislação: ARTIGOS 163.º, N.º 1, E 410.º, N.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; ARTIGOS 20.º, 91.º E 98.º DO CÓDIGO PENAL; ARTIGOS 18.º, 27.º E 30.º, N.º 2, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA
Sumário:
I – O juízo de inimputabilidade, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, do Código Penal, depende da verificação cumulativa do elemento biopsicológico, que pressupõe que o agente seja portador de anomalia psíquica no momento da prática do facto, e do elemento normativo, que se traduz na exigência de que, por força daquela anomalia psíquica, o agente tenha sido incapaz, naquele momento, de avaliar a ilicitude do facto ou de se determinar de acordo com essa avaliação.
II – Ao juízo de inimputabilidade não basta a comprovação da anomalia psíquica, sendo necessária a existência da relação causal entre aquela e o acto do agente, em termos de este o ter praticado por ser incapaz de avaliar a sua ilicitude ou de se determinar de acordo com essa avaliação, resultando esta incapacidade da anomalia psíquica que o afectava aquando da prática do facto.
III – Processualmente, a decisão sobre a inimputabilidade pressupõe a realização de perícia psiquiátrica destinada a determinar a existência de um estado psicopatológico que integre o conceito de anomalia psíquica e que tem por base factos cuja percepção e/ou apreciação exige especiais conhecimentos técnico-científicos.
IV – Obtida a pronúncia científica, cabe ao tribunal ajuizar da verificação do nexo de causalidade entre a anomalia psíquica detectada e o facto praticado, a partir dos elementos científicos fornecidos pela perícia, com vista à comprovação do elemento normativo da inimputabilidade.
V – O conceito de perigosidade, do artigo 91.º do Código Penal, reporta-se à perigosidade subjectiva, ou seja, à perigosidade reportada à personalidade do agente.
VI – A probabilidade de cometimento de outros factos no futuro, referida na norma, assenta num juízo de previsão ou de prognose em que o julgador, projectando-se futuro, avaliará sobre a eventualidade de aquela personalidade vir a estar na origem de novos factos ilícitos-típicos, ou seja, é um juízo de prognose simples sobre a probabilidade de repetição do facto típico e ilícito com base eminentemente factual.
VII – A perigosidade criminal, tal como a inimputabilidade penal, são conceitos essencialmente jurídicos, cabendo a competência para a respectiva pronúncia aos tribunais.
VIII – A medida de segurança só pode ser aplicada para salvaguarda de um interesse público preponderante.
IX – Em obediência do princípio de proporcionalidade, o julgador tem o poder-dever de determinar a suspensão da medida de internamento decretada, de acordo com o artigo 98.º do Código Penal, quando esta oferecer uma possibilidade, ainda que mínima, mas necessariamente sustentável, de assim se atingir a finalidade da medida, que é a protecção de bens jurídicos através da reintegração do agente na sociedade e da neutralização da sua perigosidade por via de adequada intervenção terapêutica em meio aberto, de acordo com o artigo 30.º, n.º 2, in fine, da Constituição da República Portuguesa.