Indemnização. Obrigação pecuniária. Privação do uso do veículo. Dano biológico. Incapacidade
INDEMNIZAÇÃO. OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA. PRIVAÇÃO DO USO DO VEÍCULO. DANO BIOLÓGICO. INCAPACIDADE
APELAÇÃO Nº 324/10.9TBCVL.C1
Relator: MARIA DOMINGAS SIMÕES
Data do Acordão: 02-12-2014
Tribunal: COVILHÃ – 1º JUÍZO
Legislação: ARTIGO 566º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário:
- À luz do preceituado no art.º 566.º a indemnização em dinheiro tem carácter subsidiário, tendo lugar, nos termos deste artigo, apenas quando não seja possível a reconstituição da situação anterior à lesão, quando ela não repare integralmente o dano ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
- Não é qualquer excesso que justifica a exoneração do devedor, permitindo-lhe substituir a obrigação de restauração natural pela obrigação pecuniária, mas apenas aquele que se apresente como um encargo de todo injustificado (e injusto) no confronto com o interesse do lesado na reposição da situação que existiria caso o dano não tivesse sido produzido; a excessiva onerosidade não se apura no confronto do valor venal do bem com o custo da respectiva reparação, antes devendo ser aferida colocando face a face o valor da reparação com aquele que o bem danificado assume no património do lesado e que tem tradução nas utilidades que lhe proporciona, implicando assim uma avaliação casuística.
- Afigura-se hoje maioritário o entendimento de que a privação do uso de um veículo em consequência de danos causados por acidente de viação importa para o seu proprietário a perda de uma utilidade, nomeadamente a de nele se deslocar quando e para onde entender, e que, em si mesma considerada, tem valor pecuniário. Constituindo assim o uso uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária é meramente consequente a conclusão de que a sua privação constitui um dano patrimonial indemnizável.
- Convergindo na caracterização do dano biológico, em que inequivocamente se traduz uma incapacidade genérica permanente, como a diminuição somático-psíquíca do indivíduo, o prejuízo “in natura”, com natural repercussão na vida de quem a sofre, têm os nossos Tribunais hesitado na sua integração numa ou outra das categorias tradicionais: danos patrimoniais de um lado, não patrimoniais do outro.
- Com méritos enquanto categoria autónoma, atento o leque de situações que nele congrega, o dano biológico releva num e noutro planos, consoante, enquanto dano primário, se projecta depois negativamente no património do lesado, amputando-o, repercutindo-se, do mesmo passo, como ofensa na esfera dos seus valores imateriais (danos consequentes).
- A incapacidade genérica parcial de que o lesado ficou portador, traduzindo a perda de funcionalidades que detinha antes do evento danoso e que por ele ficaram irremediavelmente afectadas, configura um dano de cariz biológico, cuja ressarcibilidade, independentemente da categoria em que se inclua ou da sua consideração autónoma, é indiscutível.