Impugnação da matéria de facto. Erro notório na apreciação da prova. Prova do dolo. Utilização de menor na mendicidade

IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO. ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA DO DOLO. UTILIZAÇÃO DE MENOR NA MENDICIDADE
RECURSO CRIMINAL Nº
340/08.0PAPBL.C1
Relator: VASQUES OSÓRIO 
Data do Acordão: 06-07-2016
Tribunal: LEIRIA (INSTÂNCIA LOCAL DE POMBAL– SECÇÃO CRIMINAL – JUIZ 2)
Legislação: ARTS.410.º E 412.º DO CPP; ARTS. 14.º E 296.º DO CP
Sumário:

  1. Não basta à procedência da impugnação e, portanto, para a modificação da decisão de facto, que as provas produzidas permitam uma decisão diversa da proferida pelo tribunal.
  2. Salvo existência de prova vinculada, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção [o que, com frequência, é ignorado pelos recorrentes], e por isso, não é suficiente para a pretendida modificação da decisão de facto que as provas especificadas pelo recorrente permitam um decisão diferente da proferida pelo tribunal, sendo imprescindível, para tal efeito, que as provas especificadas pelo recorrente imponham decisão diversa da recorrida.
  3. A inobservância do ónus de especificação previsto no art. 412º, nºs 3, b) e c) e 4 do C. Processo Penal, inviabiliza a modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto, pela via da impugnação ampla da matéria de facto.
  4. Existe erro notório na apreciação da prova quando o tribunal a valora contra as regras da experiência comum ou contra critérios legalmente fixados, aferindo-se o requisito da notoriedade pela circunstância de não passar o erro despercebido ao cidadão comum, por ser grosseiro, ostensivo, evidente (cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª, Edição, 2000, Editorial Verbo, pág. 341).
  5. Quando não existe confissão, a prova do dolo tem que ser feita por inferência isto é, terá que resultar da conjugação da prova de factos objectivos – em particular, dos que integram o tipo objectivo de ilícito – com as regras de normalidade e da experiência comum.
  6. O crime de utilização de menor na mendicidade, previsto no art. 296.º do C. Penal (redacção da Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro), tem como elementos constitutivos do respectivo tipo: [Tipo objectivo] – A utilização de menor ou pessoa psiquicamente incapaz, na mendicidade; [Tipo subjectivo]- O dolo, o conhecimento e vontade de praticar o facto com consciência da sua censurabilidade [bastando para o efeito o dolo eventual, ainda que dificilmente configurável em situações que não as da prática da conduta por omissão].
  7. Podendo admitir-se que o conceito de mendicidade tenha implícita a ideia de actividade, de conjunto de actos direccionados de forma organizada à obtenção de um fim e, portanto, de alguma reiteração de conduta, o bem jurídico tutelado pela incriminação impõe que o tipo se tenha por preenchido com um único acto de utilização do menor ou do incapaz na mendicidade.

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