Impugnação da decisão sobre matéria de facto. Ónus do impugnante. Falta ou deficiência da gravação. Irregularidade processual. Arguição. Contradição entre factos. Impugnação pauliana. Requisitos

IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO IMPUGNANTE. FALTA OU DEFICIÊNCIA DA GRAVAÇÃO. IRREGULARIDADE PROCESSUAL.. ARGUIÇÃO. CONTRADIÇÃO ENTRE FACTOS. IMPUGNAÇÃO PAULIANA. REQUISITOS
APELAÇÃO Nº
320/15.0T8MGR.C1
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Data do Acordão: 12-12-2017
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JC CÍVEL DE LEIRIA – J1
Legislação: ARTºS 155º, 195º E 640º NCPC; 610º A 618º C. CIVIL.
Sumário:

  1. O artigo 640º do CPC impõe ao recorrente que pretenda impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto dois ónus, definindo uma hierarquia entre eles, enunciando-se no nº1 aqueles que vêm sendo considerados/classificados de ónus principais e no nº2 estão aqueles considerados/classificados por ónus secundários, pois que daqueles estão subordinados ou dependentes.
  2. Considera-se cumprido o 2º ónus previsto no nº 2 do citado normativo, isto é, satisfeita a exigência nele prevista, desde que, no caso de audiência ter sido gravada, o recorrente identifique/indique a testemunha, a data do seu depoimento, o início e o termo da gravação do seu depoimento, da transcrição, nas alegações que antecedem as suas conclusões, das passagens mais relevantes desse depoimento, dos pontos de facto que considera incorretamente julgados, dos meios probatórios que impunham decisão diversa e bem como o sentido da decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida quanto ao factos impugnados.
  3. Decorre dos nºs 3 e 4 do artigo 155º do nCPC que a falta ou deficiência da gravação dos depoimentos constitui uma irregularidade/nulidade processual (atípica ou secundária) prevista no artº 195º, nº 1 do nCPC, que só pode ser arguida (no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação for disponibilizada) e conhecida na 1ª instância, sob pena de se dever considerada sanada, não podendo dela conhecer oficiosamente o Tribunal da Relação.
  4. Ao detetar referida deficiência da gravação dos depoimentos (que pode ser total ou parcial de algum ou de todos os depoimentos) e não dispondo de todos os elementos probatórios que suportaram quer decisão da matéria de facto, quer a sua impugnação, não poderá a Relação (a não ser que exista nos autos outra prova – vg. documental, dotada de eficácia ou força probatória plena – produzida que só por si imponha decisão diversa) conhecer – por ficar impedido de proceder à reapreciação dessa decisão – do recurso quanto à parte referente à impugnação da decisão da matéria de facto.
  5. Só existe contradição entre factos quando eles se mostrem absolutamente incompatíveis entre si, de tal modo que não possam coexistir entre si, sendo certo que essa incompatibilidade deve existir entre os próprios factos provados, e já não em relação aos factos dados como não provados, pois que em que relação a estes tudo se deve passar como se na verdade não tivessem sido alegados.
  6. São requisitos concorrentes/cumulativos da ação de impugnação pauliana individual: a) – A existência de um crédito e anterioridade desse crédito em relação à celebração do acto impugnado, ou, sendo posterior, que o acto tenha sido realizado dolosamente com vista a impedir a satisfação do crédito; b) – Resultar do acto a impossibilidade para o credor de obter a satisfação plena do seu crédito (atendendo-se à data do acto); c) – Sendo o acto oneroso, acresce a exigência da má fé tanto por parte do devedor como do terceiro.
  7. Como factos constitutivos do seu direito, é sobre o autor que incumbe o ónus de prova de tais requisitos, ou seja dos factos que os integram, sendo que, como factos impeditivos desse direito, é ao devedor ou terceiro interessado incumbe a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor.
  8. Para que se verifique o requisito da má fé não se exige a existência de qualquer concertação das partes com o fim visado, dispensando-se a prova do chamado concilium fraudis, mas tão só a prova de que o devedor e o terceiro agiram com perfeita consciência do prejuízo que vão causar ao credor com a realização do ato impugnado.

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