Força probatória dos documentos autênticos. Admissibilidade de prova testemunhal. Convenção contrária ao conteúdo de documento. Representante da compradora e vendedora outorgante no negócio. Representação voluntária. Negócio celebrado pelo representante consigo mesmo. Sub-rogação

FORÇA PROBATÓRIA DOS DOCUMENTOS AUTÊNTICOS. ADMISSIBILIDADE DE PROVA TESTEMUNHAL. CONVENÇÃO CONTRÁRIA AO CONTEÚDO DE DOCUMENTO. REPRESENTANTE DA COMPRADORA E VENDEDORA OUTORGANTE NO NEGÓCIO. REPRESENTAÇÃO VOLUNTÁRIA. NEGÓCIO CELEBRADO PELO REPRESENTANTE CONSIGO MESMO. SUB-ROGAÇÃO

APELAÇÃO Nº 26/14.7T8SCD.C1
Relator: CRISTINA NEVES
Data do Acórdão: 14-03-2023
Tribunal: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE VISEU
Legislação: ARTIGOS 5.º, 1 E 421.º, 1, DO CPC; ARTIGOS 240.º; 252.º; 255.º, 4; 256.º; 258.º; 259.º, 1; 261.º 1; 262.º; 265.º, 1; 334.º; 355.º, 2 E 3; 371.º; 393.º, 3; 394.º, 1 E 2; 592.º, 1 E 1161.º DO CÓDIGO CIVIL

Sumário:

I-Decorre do disposto no artº 639 nº1 e 2 do C.P.C., que as conclusões constituem uma súmula das alegações, pelo que, destas não poderão constar questões não incluídas no âmbito das alegações, nem a pretensão de aditamento ou impugnação de pontos de facto não incluídos no corpo das alegações, nem podem estar em contradição com o teor da motivação, sob pena de serem consideradas excessivas.
II-Quando tal aconteça, devem ter-se estas conclusões, na parte viciada, por não escritas.
III-A força probatória plena dos documentos autênticos não se estende à veracidade das declarações nele contidas, conforme resulta do disposto no artº 376, nº1, do C.P.C., que podem estar inquinadas por simulação, por vícios da vontade ou por qualquer outra causa de divergência entre a vontade real e a vontade declarada.
IV-A existência de vícios da vontade ou a veracidade das declarações contidas num documento, não abrangidas por confissão (nos termos previstos no artº 252, 255, nº4 e 258, nº2, do C.C.), pode ser impugnada por qualquer meio probatório.
V-Não é admissível prova testemunhal da existência de convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento, quer estas sejam anteriores à sua formação, contemporâneas dele ou posteriores, incluindo o acordo simulatório ou o negócio dissimulado, quando invocados pelas partes ou pelos simuladores, entre si, conforme resulta do disposto no artº 394 nº1 e 2 do C.C.
VI- No entanto, sendo apresentado um começo de prova escrita, admite-se que este seja complementado, objecto de interpretação ou esclarecimento, por prova testemunhal, ou até por presunção judicial, tendo em conta o preceituado no artº 393 nº3 do C.C.
VII- A alegação de que, apesar do declarado numa escritura pública de compra e venda, foi acordada a doação do imóvel à pretensa compradora, com diversa afectação do empréstimo concedido para aquisição do imóvel, integra convenção contrária ao conteúdo deste documento e não simulação, por não alegado o intuito de enganar terceiros (artº 240 do C.C.).
VIII-O representante que, em nome da vendedora e da compradora, outorgou no negócio, não se pode considerar um terceiro à alegada convenção, para efeitos do disposto no artº 394, nº3 do C.C.
IX- Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte, só podem ser invocados noutro processo contra essa mesma parte, desde que o regime de produção da prova do primeiro processo ofereça às partes garantias não inferiores às do segundo e que o processo em que a prova foi realizada não tenha sido anulado, na parte relativa à produção da prova que se pretende invocar, requisitos que incumbe àquele que se quer valer do depoimento, invocar (artº 421, nº1, do C.P.C.).
X-A representação voluntária distingue-se do contrato de mandato, por o representante não estar vinculado à prática de qualquer acto, embora se encontre habilitado a praticá-los, por via da declaração unilateral que lhe conferiu estes poderes (procuração).
XI-O representante voluntário, actua perante terceiros em nome do representado e os efeitos jurídicos dos negócios por aquele realizados, nos limites dos seus poderes, produzem-se, conforme resulta do artº 256 do C.C., na esfera jurídica do representado.
XII-Decorre do disposto no artº 261 do C.C. que o negócio celebrado pelo representante consigo mesmo, seja em nome próprio, seja em representação de terceiro é anulável, excepto se:
-o representado tenha especificadamente consentido na celebração deste negócio;
-o negócio exclua por sua natureza a possibilidade de um conflito de interesses;
XIII- O negócio consigo mesmo inclui os casos de dupla representação: o representante (voluntário) de um dos contraentes não pode, na qualidade de representante deste, celebrar negócio com o outro contraente também por ele representado.
XIV-Mesmo que não resulte provada a concreta relação subjacente à emissão de procuração, tendo esta procuração sido utilizada para a venda de um bem do representado, este pode exigir do procurador a entrega do valor do preço recebido, nos termos do artº 258.º do Código Civil, por o negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, produzir os seus efeitos (nomeadamente o direito a receber o preço) na esfera jurídica deste último
XV- A sub-rogação consiste na substituição do credor, na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento.
XVI- Nos casos em que o terceiro tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver diretamente interessado na satisfação do crédito, este transmite-se por sub-rogação legal para o terceiro solvens (artº 592., n.º 1, do Código Civil) e não por sub-rogação convencional.

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