Falsidade de testemunho. Momento em que a testemunha faltou à verdade

FALSIDADE DE TESTEMUNHO. MOMENTO EM QUE A TESTEMUNHA FALTOU À VERDADE
RECURSO CRIMINAL Nº
1341/16.0T9CBR.C1
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Data do Acordão: 24-04-2018
Tribunal: COIMBRA (J L CRIMINAL – J1)
Legislação: ART. 360.º DO CP
Sumário:

  1. A falsidade de declaração a que se reporta o artigo 360.º do CP corresponde à desconformidade entre a declaração emitida pelo agente e a realidade por ele apreendida, independentemente de a verdade ter sido apurada no processo e qual seja ela, de acordo com a conceção subjectivista que seguimos, pelo que a circunstância de o tribunal de julgamento nada ter apurado sobre a verdade do facto objeto da declaração, ou seja, se a compra de produto estupefaciente aos três arguidos no processo anterior teve ou não lugar, não impede que a conduta do ora arguido possa ter preenchido os elementos objectivos e subjetivos do crime de falsidade de testemunho previsto no artigo 360.º do CP, contrariamente ao que sucederia na conceção objetiva de declaração falsa.
  2. Assim, caso se imponha concluir, perante declarações claramente contraditórias entre si, em que uma delas exclui necessariamente a outra, que o agente declarou com falsidade, é igualmente irrelevante que não se apure em que momento a testemunha faltou à verdade, pois o seu comportamento como declarante no processo deve ser perspectivado na sua globalidade, pelo que “essa falta de fidelidade à verdade traduzida num desvio da declaração em relação à realidade apreendida pelo próprio declarante e descortinada através de uma visão integrada de toda a sua conduta processual, é por si só suficiente para implicar a prática de um ilícito-típico objectivo de falsidade de depoimento” – cfr Nuno Brandão, Inverdades e consequências: considerações em favor de uma conceção subjectiva da falsidade de testemunho. Anotação aos acórdãos da Relação do Porto de 30.01.2008 e da Relação de Guimarães de 29.06.2009 in RPCC 2010, 3, p. 477 e segs. (pág. 503).
  3. Quando subsista dúvida sobre o exacto momento em que o agente faltou à verdade e essa dúvida tenha relevo penal ou processual penal, v.g. para efeitos de prescrição ou da agravação prevista no n.º 3 do art.º 360.º do CP, tal dúvida não pode deixar de ser valorada a favor do arguido em obediência ao princípio in dubio pro reo.
  4. A exigência de que a verdade histórica objectiva tivesse de ser apurada e, por isso, devesse constar já da acusação, parece-nos excessiva, atentando em que, além do mais, essa mesma verdade consubstancia matéria do âmbito do processo em que depôs, e não, propriamente, do objecto agora em julgamento.

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