Exclusão de partes presuntivamente comuns do regime da propriedade horizontal. Partes comuns objectivamente destinadas ao uso de determinada fracção autónoma. Direitos pessoais de gozo. Obras ilícitas. Abuso de direito

EXCLUSÃO DE PARTES PRESUNTIVAMENTE COMUNS DO REGIME DA PROPRIEDADE HORIZONTAL. PARTES COMUNS OBJECTIVAMENTE DESTINADAS AO USO DE DETERMINADA FRACÇÃO AUTÓNOMA. DIREITOS PESSOAIS DE GOZO. OBRAS ILÍCITAS. ABUSO DE DIREITO

APELAÇÃO Nº 2119/18.2T8LRA.C3
Relator: TERESA ALBUQUERQUE
Data do Acórdão: 23-01-2024
Tribunal: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA
Legislação: ARTIGOS 334.º; 335.º, 2; 1418.º, 2, B); 1421.º, 1, A), 2, A) E 3; 14222.º, 1, 3 E 4; 1425.º, 1 E 1429.º-A, DO CÓDIGO CIVIL

 Sumário:

I –Os condóminos podem organizar-se e constituírem-se em assembleia, desde que constituída a propriedade horizontal, não carecendo de inscreverem o condomínio no registo e tão pouco de possuírem regulamento de condomínio.
II – Relativamente às partes que presuntivamente são comuns – como sucede com os pátios e os jardins anexos ao edifício, cfr al a) do nº 2 do art 1421º CC – podem convencionar que as mesmas sejam excluídas desse regime, desde que no titulo constitutivo da propriedade horizontal as afectem a uma ou mais fracções. Essa afectação vinculará os futuros adquirentes das fracções, independentemente do seu assentimento, desde o registo desse titulo.
III – Diferente dessa situação é a das «destinações objectivas», igualmente incidentes sobre partes presuntivamente comuns do edifício, e que decorrem da circunstância fáctica de uma tal parte se encontrar, desde data anterior à da constituição da propriedade horizontal, destinada objectivamente a determinada fracção autónoma.
IV – Ainda relativamente a partes presuntivamente comuns, podem os condóminos, desde que na sua totalidade, e mesmo antes da constituição da propriedade horizontal, constituir direitos pessoais de gozo a favor de todos ou de parte deles, fazendo-o por mero acordo verbal.
V – Esses direitos pessoais de gozo não são oponíveis a terceiro que adquira a fracção sobre que os mesmos incidam, a menos que a exclusividade deles decorrente for ou vier a se, referida no título constitutivo da propriedade horizontal, caso em que se passará a estar perante um direito real.
VI – O direito pessoal de gozo traduz-se no poder de agir directa e autonomamente sobre uma coisa, mas apenas em função do seu aproveitamento naturalístico – o aproveitamento directo e efectivo das utilidades de certa coisa, que permite o uso, a fruição e por vezes a transformação da coisa – não se compaginando com obra que afecte parte imperativamente comum do prédio, que sempre carecerá de ser aprovada nos termos do art 1425º/1 do CC.
VII – Quando se conclua que o terceiro, relativamente ao acordo de que resultou a atribuição de direitos pessoais de gozo à totalidade dos condóminos do prédio e que adquiriu subsequentemente uma das fracções, também ele agiu ilicitamente, por ter procedido a obras que alteraram a estrutura arquitéctonica daquele, haverá que ponderar e graduar os resultados das contrapostas ilicitudes, para se concluir se o mesmo agiu, na interposição da acção, em abuso de direito na modalidade de tu quoque.

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