Erro na forma de processo. Nulidade processual. Declaração de insolvência. Inutilidade superveniente da lide. Resolução. Contrato de arrendamento. Insolvente
ERRO NA FORMA DE PROCESSO. NULIDADE PROCESSUAL. DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA. INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE. RESOLUÇÃO. CONTRATO DE ARRENDAMENTO. INSOLVENTE
APELAÇÃO Nº 3067/16.6T8CBR.C1
Relator: ANTÓNIO DOMINGOS PIRES ROBALO
Data do Acordão: 27-04-2017
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JL CÍVEL – J2
Legislação: ARTºS 193º, 196º E 287º, AL. E), DO NCPC; AC. UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA DO STJ DE 08/05/2013; ARTº 108º, Nº 4, AL. A), DO CIRE
Sumário:
- O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr.artºs.193 e 196 do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), deve ser conhecido no despacho saneador (cfr.artº. 595, nº.1, al.a), do C.P.Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr.artº. 200, nº.2, do C.P.Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.Civil), sendo que a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte.
- É consabido que o erro na forma de processo ocorre nos casos em que a pretensão não seja deduzida segundo a forma geral ou especial de processo legalmente previstas.
- Tratando-se de lide intentada contra a insolvente, antes da declaração de insolvência, não se encontra no CIRE qualquer disposição que apodicticamente disponha que as ações pendentes à data da declaração de insolvência em que seja demandado o devedor tenham de ver a instância extinta por impossibilidade, ou inutilidade, superveniente da lide.
- A massa insolvente (conceito constante do artigo 46.º, n.º 1 do CIRE) consiste em todo o património do devedor à data da declaração da insolvência, tal como os bens e os direitos que venha a adquirir na pendência do processo, e que não sejam absolutamente impenhoráveis.
- O CIRE não regula de forma sistematizada os efeitos da declaração de insolvência sobre as ações declarativas intentadas contra o insolvente, o que se compreende, porque estas ações não colocam em crise, pelo menos de forma imediata, o princípio par conditio creditorum, ao contrário do que pode suceder com as ações executivas.
- O Ac. do STJ de 08/05/2013, proferido no processo 170/08.0TTALM.L1.S1, com vários votos de vencido, publicado na base de dados do IGFEJ e também na 1ª série do Diário da República de 25/02/2014, pretendeu uniformizar a jurisprudência no seguinte sentido: “Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287 do CPC”.
- O preceituado na alínea a) do n.º 4 do artº 108º do CIRE priva o senhorio do direito de resolução do contrato com fundamento na falta de pagamento das rendas respeitantes ao período anterior à declaração da insolvência.
- Se a ação for intentada antes de ser declarada a insolvência, o efeito da norma não pode ser – não podia ser logicamente – o de impedir a propositura da ação, mas sim o de impossibilitar a continuação da ação a partir do trânsito em julgado da declaração. Ou seja, no caso, está-se perante uma causa de extinção da instância por impossibilidade superveniente quanto a este pedido (cfr. alínea e) do art.287º do CPC).
- Se o locador não pode resolver o contrato com o fundamento no não pagamento de rendas do insolvente, não interessa que já tivesse pedido a resolução, pois que a lei lhe tira o direito de o fazer com aquele fundamento objectivo.
- Ocorrendo o fundamento de resolução do contrato de arrendamento com o não pagamento das rendas depois da declaração de insolvência, esse novo fundamento terá de dar origem a outro pedido, com base numa diferente situação de facto, dirigido a entidade diferente (massa insolvente representada pelo administrador da insolvência) e formulado noutro tribunal. E isso por estar dependente do processo de insolvência, local próprio para se discutirem as questões relacionadas com a massa insolvente, tanto mais que o que está em causa é um fundamento resolutivo relacionado com dívidas que deixam de ser da insolvência para passarem a ser da massa insolvente.
- Face ao exposto, temos para nós, que a inutilidade superveniente deve também abranger a resolução do contrato, desde logo, por o reconhecimento da validade da resolução ter consequências patrimoniais, pelo que também tal como no pedido das rendas vencidas acaba por se reconduzir a um direito de crédito.