Despacho de pronúncia. Indícios suficientes. Crime de usurpação. Acórdão uniformizador n.º 15/2013. Dolo

DESPACHO DE PRONÚNCIA. INDÍCIOS SUFICIENTES. CRIME DE USURPAÇÃO. ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR N.º 15/2013. DOLO
RECURSO CRIMINAL Nº
29/16.7EACTB.C1
Relator: VASQUES OSÓRIO
Data do Acordão: 27-06-2018
Tribunal: GUARDA (J L CRIMINAL)
Legislação: ARTS. 283.º, 286.º E 308.º DO CPP; ART. 42.º DA CRP; ARTS. 68.º, 149.º, 178.º, 184.º, 195.º E 197.º DO CDADC; ARTS. 14.º E 16.º DO CP
Sumário:

  1. Os indícios são suficientes sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança.
  2. São elementos constitutivos do tipo de crime usurpação, que tutela o bem jurídico criação intelectual, artística e científica: [Tipo objectivo] – Que o agente, sem autorização do autor, do artista, do produtor de fonograma e videograma ou do organismo de radiodifusão, utilize uma obra ou prestação por qualquer das formas previstas no código; – Que o agente divulgue ou publique, abusivamente, uma obra ainda não divulgada nem publicada pelo autor ou não destinada à divulgação ou publicação, mesmo que identifique a respectiva autoria; – Que o agente colija ou compile obras publicadas ou inéditas, sem autorização do autor; – Que o agente, estando autorizado a usar obra, prestação de artista, fonograma, videograma ou emissão radiodifundida, exceda os limites da autorização, com excepção dos casos previstos no código; [Tipo subjectivo] – O dolo, o conhecimento e vontade de praticar o facto com consciência da sua censurabilidade [em qualquer das modalidades previstas no art. 14º do C. Penal].
  3. A comunicação pública da obra não se confunde com a transmissão e a retransmissão, também modalidades de utilização da obra. Nestas, o que está em causa é a radiodifusão da obra, incluindo a sua recepção, que constitui o termo do processo de transmissão e que é livre. Já na comunicação pública existe uma reutilização da obra, a concreta transmissão efectuada acrescenta, modifica ou inova [relativamente à obra que está a ser radiodifundida], produzindo uma nova utilização dela, através de uma modificação da forma de recepção operada por meios técnicos, de modo a obter o seu aproveitamento para a produção de um efeito visual ou sonoro, criador de uma encenação ou espectáculo, que não teriam lugar com a mera recepção da obra radiodifundida (cfr. Acórdão Uniformizador n.º 15/2013).
  4. A especialíssima e relevantíssima circunstância de o tribunal do topo da hierarquia dos tribunais judiciais portugueses ter deixado expresso, através de um Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, que condutas como a imputada nos autos pela assistente à arguida, não integram a prática do crime de usurpação, p. e p. pelos arts. 149º, 195º e 197º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, aliada à ampla divulgação pública feita de tal aresto uniformizador, tornam claramente desrazoável o entendimento de que deva exigir-se à arguida, perante a posição do Supremo Tribunal de Justiça e contrariamente a esta, a consciência de que a sua conduta era contrária à ordem jurídica.
  5. Deste modo, tendo em conta o disposto no art. 16.º, n.º 1 do CP, não se pode ter por suficientemente indiciado o dolo da arguida, em qualquer das modalidades previstas no art. 14.º do mesmo código. 

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