De uma certa mítica vive a História
ANTÓNIO BARREIROS
De uma certa mítica vive a História
22 de Fevereiro 2019
Assisti, com cerca de uma centena de outras pessoas presentes no salão nobre, a um ciclo de conferências comemorativas do Centenário do Tribunal da Relação de Coimbra sobre o tema genérico da Obra e Vida do Infante D. Pedro.
A intervenção, a primeira da tarde do passado dia 20, do Doutor Alfredo Pinheiro Marques, deixou-me disposto a, e no final, interpelá-lo, mas o tempo avançara, aguardando-nos uma visita à exposição que o próprio havia preparado para a varanda interior, em toda a ala do edifício do Palácio da Justiça de Coimbra.
Neste “púlpito” deixo o que me apetecera confrontar o docente para que a circulação das ideias e das opiniões possa chegar mais longe, no caso aos que não estiveram presentes.
Não dispondo de conhecimentos profundos sobre a história do tempo do Infante D. Pedro, mas já tendo encontrado referências à sua sabedoria, cultura e conhecimentos náuticos e outros, admirei a exposição do Dr. A. P. Marques, pois colocou essa figura portuguesa no lugar que já deveria ocupar no legado da nossa História, assim como, traçando uma parte do seu percurso regente (breve) e não só, o reabilitou e trouxe a público, aliás, como já o fez por outras vezes, a força da sua atitude na causa dos Descobrimentos portugueses.
Esta figura controversa da nossa história, que foi filho de D. João I e de Filipa de Lencastre, acabaria por tomar o cargo de 1.º Duque de Coimbra e Príncipe da Dinastia de Aviz. O Infante D. Pedro pelas suas viagens é conhecido como o “Infante das Sete Partidas”.
Quero deter-me numa parte da palestra de Alfredo P. Marques que me deixou proporcionado a questioná-lo, o que verto aqui nestas páginas, até para que possa elevar-se a fasquia do diálogo, sendo certo que alguns dos protagonistas da Universidade de Coimbra, e neste particular o Departamento de História da Faculdade de Letras, são avessos a admitir certas teses o que – permitam-me afirmá-lo – não se mostra razoável a uma Instituição de Ensino que, e em democracia, tem de defender o contraditório e estabelecer a dúvida para escavar a verdade. Só dessa forma se poderá promover a investigação que, e tendencialmente, deve fazer luz, logo proporcionar melhor conhecimento.
Mas o Dr. Alfredo, um estudioso que se percebe um animador da figura do Infante D. Pedro, trespassou uma linha que, e como o disse já ouvira falar, ou seja, desmereceu o Infante D. Henrique no projecto Português dos Descobrimentos. Em sua vez, enalteceu a do Infante D. Pedro, como o homem que abraçou essa causa nacional.
E é aqui que bate o ponto, perdoe-se-me a expressão. Isto porque, e sabendo que isso terá sido a realidade, não podemos abandonar uma certa mítica a que, e também, faz a história.
É que – a minha modesta opinião obriga-me a reflectir sobre o que vou explicitar – a História e o Mito com linguagem e descritivos próprios, o racional e o simbólico, devem convergir. Convergir para se construir uma linha que pode e deve dar sustentabilidade ao que conhecemos. Assim, opino, apesar de não ser um historiador nem para lá caminhar, que pode a História e a Mítica abraçar-se no que se designa “Tempo do Sentido”.
O Infante D. Henrique pode não ter sido o que nos ensinaram e pode não ter tido a importância – talvez nenhuma – que lhe atribuímos nos nossos Descobrimentos, mas desvalorizá-lo, e numa penada, sem preparação e enquadramento histórico, é destruir a tal parte mítica de que a História, também vive e sobrevive. Compreendo o Dr. Alfredo, mas vamos devagar para não criarmos atritos.
E aproveito para juntar uma outra parte, a mística, porque a História está arreigada – muitos episódios, alguns de raiz popular, se anexam a factos da construção e da vida de Portugal – a essa banda que se alapa na fé, na religiosidade e na espiritualidade que se apodera do coração e da alma das gentes lusas.
Percebi a mensagem de Alfredo P. Marques, na sua ânsia de reabilitar a figura mítica – não o deixa de ser, como qualquer outra que é histórica – do Infante D. Pedro, até por tudo que nos associa a ele, aos conimbricenses, aos da Beira litoral e a todos os portugueses, mas ficaria de mal comigo se, e sem jeito de adornar a excelência da oratória de saber desse distinto docente universitário (mal amado por alguns dos seus pares) não trouxesse esta minha divergência de leigo na matéria, por ter reparado que, e na palestra que ousou apresentar, tenha tido a coragem para “deserdar” o Infante D. Henrique da posição que nunca ocupou no Plano e na Implementação do Projecto dos Descobrimentos Portugueses.
Ao menos deixemos-lhes um espaço nesse domínio. Nem que seja o de continuar a ser uma Figura Mítica da História Portuguesa. Precisamos dela, com o de outras, para o simbolismo.
E não nos poderemos esquecer que as Forças Armadas dependem – seguiu-se uma intervenção do Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, Almirante A. Silva Ribeiro – no êxito da sua missão militar de exemplos figurativos da nossa História para terem arcaboiço e tenacidade no cumprimento dos seus deveres.