Crime de ofensa à integridade física
CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA
RECURSO CRIMINAL Nº 800/18.5PBCLD.C2
Relator: ROSA PINTO
Data do Acórdão: 24-05-2023
Tribunal: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DAS CALDAS DA RAINHA – JUIZ 1
Legislação: ARTIGOS 132.º, N.º 2, ALÍNEAS C) E J), 143.º, N.º 1, ALÍNEA A), E N.º 2, E 145.º DO CÓDIGO PENAL
Sumário:
I – No crime de ofensa à integridade física o objecto da acção é o corpo humano e o bem jurídico protegido é a integridade física e psíquica de outra pessoa.
II – O crime não exige uma forma específica de actuação ou uma causalidade especial, o que significa que se trata de um crime de forma livre.
III – Para preencher o tipo objectivo do crime de ofensa à integridade física é admissível qualquer meio de ofender o corpo ou a saúde desde que se verifique, como resultado, a lesão do corpo ou da saúde de alguém com alguma expressão ou significado, isto é, é necessário que o dano produzido pela acção do agente seja juridicamente apreciável.
IV – Não adquirem dignidade penal, sob o ponto de vista do bem jurídico tutelado, as situações em que ocorre ausência de consequências da agressão ou em que estas sejam insignificantes.
V – Por isso o crime de ofensa à integridade física configura-se como um crime de dano quanto ao bem jurídico tutelado, uma vez que o tipo exige a verificação do resultado lesão do corpo ou da saúde de outrem sendo, por isso, necessário fazer a imputação objectiva desse resultado à conduta ou à omissão do agente, nos termos do artigo 10.º do Código Penal.
VI – Como elemento subjectivo do crime exige-se a vontade de ofender corporalmente o lesado, o mesmo é dizer uma imputação subjectiva fundada no dolo, em qualquer das modalidades previstas no artigo 14.º do Código Penal, sendo a motivação do agente irrelevante sob este ponto de vista, embora possa ser tida em conta para efeitos de determinação da medida da pena.
VII – O expediente de que se socorreu o n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal para qualificar censurabilidade ou perversidade da conduta, que consiste, por um lado, na formulação genérica do tipo, e, por outro, na inventariação de índices que, na perspectiva do legislador, são sintomaticamente susceptíveis de preencher esse mesmo tipo, destina-se a facilitar a tomada de juízos mais seguros, mas a verificação de tais índices, como meros indiciadores ou referenciais que são, não leva, só por si, ao agravamento da censura penal, sendo indispensável ainda apurar, no caso concreto, se o índice em causa tem a virtualidade de revelar força que justifique tal agravamento.
VIII – Tendo resultado provado, apenas, que os arguidos sabiam que o ofendido havia sofrido um AVC, mas desconhecendo-se quando este ocorreu, que consequências físicas resultaram para o ofendido, se as mesmas se mantinham na data da prática dos factos e se, por isso, o ofendido não tinha capacidade, destreza ou discernimento para se defender, e não tendo resultado provado, ainda, a idade do ofendido e que, em razão de doença ou deficiência, se encontrava numa situação de desamparo, à mercê dos arguidos, incapaz de se defender, não se encontra verificada a qualificativa da alínea c) do n.º 1 do artigo 132.º do Código Penal.
IX – A presença de um menor aquando da prática de um crime de ofensa à integridade física não conduz à qualificação do crime, porque tal circunstância não traduz uma situação valorativamente análoga com as várias que se encontram elencadas nas alíneas do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal, nem traduz uma especial censurabilidade ou perversidade do agente.